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Aumento de feminicídios acende alerta e impulsiona atos nos 21 Dias de Ativismo

Escalada de assassinatos de mulheres evidencia falhas estruturais, provoca reação social e leva movimentos feministas a convocarem mobilização nacional no dia 7; Lula faz apelo enfático aos homens

Publicado: 05 Dezembro, 2025 - 11h13 | Última modificação: 05 Dezembro, 2025 - 18h34

Escrito por: André Accarini

reprodução
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Os alarmantes números de feminicídio em 2025 revelam uma tragédia contínua no Brasil, exigindo que o tema da violência contra a mulher seja tratado com a máxima urgência. O país já ultrapassou mil feminicídios registrados apenas neste ano, enquanto mais de 2,7 mil mulheres sobreviveram a tentativas de assassinato entre janeiro e setembro, uma estatística que, por si só, revela o tamanho da violência cotidiana enfrentada pelas mulheres brasileira.

Reação da sociedade: mobilização feminista e pronunciamento de Lula

A sucessão de casos durante os 21 Dias de Ativismo provocou reações de movimentos feministas, instituições e lideranças políticas. Em meio ao aumento dos feminicídios, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um pronunciamento firme em Pernambuco, direcionado especialmente aos homens.

Lula pediu uma mudança de postura masculina e defendeu a criação de “um grande movimento nacional contra os animais que batem e maltratam as mulheres”. O presidente lembrou os conselhos de sua mãe, Dona Lindu, sobre resolver conflitos de forma digna e sem violência, reforçando que nenhum motivo justifica levantar a mão contra uma mulher.

A ministra das Mulheres, Márcia Lopes, afirmou que a violência contra mulheres no Brasil permanece em um patamar “inacreditável” e não pode ser naturalizada pela sociedade. Segundo ela, o machismo e a misoginia ainda fazem com que agressões sejam tratadas como comportamento comum nas relações, o que agrava a crise.

“Não podemos, jamais, naturalizar essa situação, como parte da sociedade acaba fazendo ao longo dos anos. É inacreditável essa cultura, quase que incorporando a violência como um ato normal de uma relação, pelo machismo, pela misoginia, por tudo aquilo que a gente tem historicamente na sociedade”, destacou a ministra em entrevista à TV Brasil.

Márcia destacou que os dados continuam “estarrecedores” e exigem resposta urgente do poder público. Para enfrentar o problema, a ministra afirmou que o governo intensificou a integração com estados e municípios e ampliou a rede de serviços de proteção. As ações incluem endurecimento das leis, reforço ao Ligue 180 e inserção de conteúdos de prevenção em escolas e universidades.

Ela ressaltou também o papel decisivo dos municípios, que atuam diretamente com escolas, unidades básicas de saúde e comunidades religiosas. Márcia defendeu que a violência de gênero é um fenômeno histórico e que a sociedade precisa compreender o que motiva homens a cometerem agressões, incluindo o feminicídio.

A repercussão do discurso coincidiu com a convocação feita por Anne Moura, secretária nacional de Mulheres do PT, que também anunciou o grande ato nacional no próximo dia 7 de dezembro, às 10h, como forma de pressionar por respostas políticas e sensibilizar a sociedade. Anne destacou o perigo do “silêncio dos bons” diante da misoginia e argumentou que enfrentar o feminicídio também exige consciência na escolha de representantes públicos.

Nas ruas

Também em resposta à escalada brutal da violência de gênero no Brasil, o movimento Levante Mulheres Vivas convocou atos simultâneos em diversas cidades do país, com a maioria das mobilizações prevista para este domingo, 7 de dezembro. A ordem é ocupar as ruas, preferencialmente vestidas de roxo, portando faixas e cartazes, para pedir justiça e exigir a efetivação das políticas de proteção.

Atos estão confirmados em quase 50 cidades, incluindo capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Florianópolis e Belém. Além do dia 7, manifestações ocorrem também neste sábado (6).

Cidades já confirmadas

 

REGIÃO CENTRO-OESTE

06/12 (sábado)

  • Cuiabá/MT – Praça Santos Dumont, 14h

07/12 (domingo)

  • Brasília/DF – Feira da Torre de TV, 10h
  • Campo Grande/MS – Av. Afonso Pena, 9h
  • Goiânia/GO – Praça Universitária, 15h
  • Paranaíba/MS – Praça da República, 8h

REGIÃO NORDESTE  

07/12 (domingo)

  • Aracaju/SE – Arcos da Orla, 8h30
  • Fortaleza/CE – Estátua Iracema Guardiã, 16h
  • João Pessoa/PB – Busto de Tamandaré, 15h
  • Maceió/AL – Praça Sete Coqueiros, 15h
  • Natal/RN – Mercado da Redinha, 9h
  • Parnaíba/PI – Parnaíba Shopping, 16h
  • Recife/PE – Rua da Aurora / Ginásio Pernambuco, 14h
  • Salvador/BA – Barra (Cristo ao Farol), 10h (14/12)
  • São Luís/MA – Praça Igreja do Carmo, 9h
  • Teresina/PI – Praça Pedro II, 17h
  • Vitória da Conquista/BA – Feirinha do Bairro Brasil, 9h

REGIÃO NORTE

06/12 (sábado)

  • Belém/PA – Boulevard Gastronomia, 8h

07/12 (domingo)

  • Boa Vista/RR – Tribuna em frente à ALE-RR, 16h30
  • Manaus/AM – Praça do Congresso, 17h
  • Marabá/PA – Praça da Marabá Pioneira, 18h
  • Palmas/TO – Feira do Bosque, 17h
  • Parintins/AM – Catedral (Centro), 16h30

10/12 (quarta)

  • Santarém/PA – Praça Tiradentes, 17h30

REGIÃO SUDESTE

07/12 (domingo)

Espírito Santo

  • Vitória – Praia de Camburi, 15h

Minas Gerais

  • Belo Horizonte – Praça Raul Soares, 10h
  • Cataguases – Praça Santa Rita, 10h
  • Divinópolis – Praça do Planalto, 8h30
  • Juiz de Fora – Escadaria da Câmara, 15h
  • Pouso Alegre – Praça Senador José Bento, 14h
  • Uberaba – Concha Acústica, 14h
  • Uberlândia – Av. Monsenhor Eduardo, 14h

Rio de Janeiro

  • Rio de Janeiro (RJ) – Copacabana (Posto 5), 10h

São Paulo

  • Araraquara – Praça Santa Cruz, 9h
  • Botucatu – Praça da Pinacoteca, 10h
  • Campinas – Estação Cultura, 9h
  • Ilhabela – Praça Elvira Estoraci, 16h
  • Ribeirão Preto – Informações em breve
  • Santos – Praça das Bandeiras, 14h
  • São José dos Campos – Largo São Benedito, 15h
  • São Paulo (SP) – MASP (Vão Livre), 14h
  • Sorocaba – Parque dos Espanhóis, 10h

REGIÃO SUL

06/12 (sábado)

  • Joinville/SC – Praça da Bailarina, 14h
  • Porto Alegre/RS – Praça da Matriz, 17h

07/12 (domingo)

  • Chapecó/SC – Praça Coronel Bertaso, 14h

Escalada da violência

A situação é especialmente crítica em São Paulo: a capital paulista atingiu o maior índice anual de feminicídios desde o início da série histórica em 2015, somando 53 casos entre janeiro e outubro de 2025, um recorde mesmo sem contar os últimos dois meses do ano. Em todo o estado de São Paulo, foram 207 feminicídios no mesmo período, representando um aumento de 8% em relação ao ano anterior.

A escalada da violência motivou ações no âmbito legislativo. No estado, a Bancada Feminista do PSOL protocolou pedido para instaurar uma CPI dos Feminicídios, com objetivo de investigar o aumento dos casos e possíveis falhas nas políticas de prevenção e proteção no âmbito do governo estadual de Tarcísio de Freitas.

Já o Rio de Janeiro registrou 107 feminicídios em 2024, e o cenário geral de violência no estado vitimou mais de 154 mil mulheres no ano, o equivalente a 18 vítimas por hora. A maioria das vítimas de feminicídio no Rio de Janeiro (71%) já havia sofrido alguma agressão anterior, mas apenas 13 possuíam medida protetiva.

“Estamos em um dos momentos mais críticos e violentos desde que o feminicídio foi tipificado como crime em 2015. Ter esses dados, essa realidade, em plena campanha dos 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra Meninas e Mulheres, em que a gente luta por paz, por vida, é muito doloroso”, diz a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Amanda Corcino.

Ela reforça que os números de 2025 expõem um cenário que demanda respostas imediatas e estruturais.

Casos recentes: os padrões de controle, ameaças e violência extrema

A imprensa e o s movimentos feministas expõem, diariamente, episódios marcados por brutalidade e por uma lógica de posse sobre a vida da mulher, elemento central que caracteriza a maioria dos feminicídios. Os recentes casos relatados em diferentes estados do país reforçam esse padrão.

O caso de Tainara Souza Santos, 31 anos, ocorrido em 29 de novembro em São Paulo, sintetiza esse ciclo. Tainara foi atropelada e arrastada por aproximadamente um quilômetro na Marginal Tietê pelo ex-companheiro, Douglas Alves da Silva, de 26 anos, que não aceitava o fim do relacionamento. Em decorrência das lesões, Tainara teve as duas pernas amputadas e permanece internada em estado grave. O ataque, ocorrido em via pública e registrado em vídeos, provocou grande repercussão social.

No dia seguinte, outro episódio ampliou a sensação de urgência. Em 1º de dezembro, o agressor da ex-companheira Evelin de Souza Saraiva, 38 anos, invadiu a pastelaria onde ela trabalhava e disparou ao menos seis vezes usando duas pistolas. Segundo informações, a mulher já vinha sendo ameaçada desde a separação.

Em Recife, a violência assumiu proporções devastadoras. Isabele Gomes de Macedo, 40 anos, e seus quatro filhos, com idades entre 1 e 7 anos, morreram carbonizados após o companheiro incendiar a residência da família. O caso ilustra uma das dinâmicas mais recorrentes da violência doméstica: a escalada sucessiva de ameaças e agressões até o desfecho fatal.

Em Maceió, um episódio que poderia ter terminado em morte foi registrado em vídeo: um homem identificado como cantor foi flagrado injetando veneno de rato na garrafa d’água da ex-esposa, após invadir a residência dela mesmo sob medida protetiva. A vítima acompanhou em tempo real toda a movimentação do agressor pelas câmeras internas e acionou imediatamente a Patrulha Maria da Penha. O suspeito foi localizado e detido por descumprimento da medida protetiva.

A violência de gênero também atinge mulheres trans. Em Belo Horizonte, Alice Martins Alves, 33 anos, morreu após ser espancada por garçons de um bar, motivados por uma dívida de R$ 22 e por transfobia. O Ministério Público enquadrou o caso como feminicídio qualificado, por envolver menosprezo à condição de mulher.

No fim do mês de novembro, o Brasil assistiu estarrecido também a outro caso, dessa vez de duplo feminicídio no Rio. A diretora da equipe pedagógica Allane de Souza Pedrotti Matos, de 41 anos, e a psicóloga da instituição, Layse Costa Pinheiro, de 40 anos, foram assassinadas a tiros dentro do setor de pedagogia. O atirador era o servidor João Antônio Miranda Tello Ramos, que após o assassinato das vítimas cometeu suicídio. Ele não aceitava ser subordinado a mulheres no trabalho.

Casos como esses demonstram não apenas a letalidade dos ataques, mas também a persistência da violência mesmo após separações, medidas judiciais e tentativas de romper o ciclo abusivo.