ZPEs - Zonas de Processamento de Exportação
Publicado: 23 Julho, 2007 - 10h13
Escrito por: Com 19 vetos do presidente Lula, lei é publicada hoje (23)
O Diário Oficial de hoje (23) publica a lei de criação das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs), com 19 vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que contrariam a todos, de defensores a adversários dessas zonas francas industriais. Lula manteve o artigo que permitirá às empresas instaladas nas ZPEs vender até 20% da produção ao mercado interno; mas, em compensação, vetou os pontos com as vantagens tributárias e cambiais a serem concedidas a essas empresas. E vetou também o dispositivo que o obrigaria a regulamentar a lei em até 60 dias.
Um acordo no Senado, aceito pelo governo para evitar problemas com dois velhos caciques políticos, José Sarney (PMDB-AP) e Tasso Jereissati (PSDB-CE), garantiu a aprovação do projeto após quase 11 anos de tramitação no Congresso. Pelo acordo, pontos polêmicos seriam vetados e regulamentados por medida provisória. Adiou-se o confronto com o problema, mas a encrenca continua pairando sobre o Planalto. Não são só os políticos que prometem briga por causa das ZPEs: o leque de interessados - e descontentes - vai da indústria paulista ao governo da Argentina.
O embaixador argentino, Juan Pablo Lohle, manteve encontros com a direção da Fiesp, na semana passada, incomodado com a perspectiva de mais uma "assimetria" na política industrial brasileira. Os argentinos são contrários à medida. Até hoje o Mercosul não conseguiu encaixar satisfatoriamente o tratamento aos produtos das Zonas Francas existentes, e as ZPEs são mais uma excepcionalidade, nova confissão de fracasso do governo no esforço para criar uma união alfandegária decente, algo que o Mercosul prometeu - e nunca conseguiu - ser.
A disputa pela regulamentação das ZPEs abre novo foco de conflito entre o Palácio do Planalto e os interesses regionais. O governo cearense, onde há até uma frente legislativa pró-ZPEs, já começou o licenciamento ambiental da área em que planeja instalar a nova Zona Franca. No Mato Grosso, o senador petista Delcídio Amaral já anunciou que espera ver em Corumbá a primeira ZPE do país, e que lutará para criar outras no Estado. Sarney, claro, batalha ZPEs para o Maranhão e Amapá.
São Paulo, enquanto isso, sobe pelas paredes. A Fiesp já tem marcada reunião com a Receita Federal para calibrar as isenções fiscais a serem concedidas às empresas nessas zonas francas, e comemora o veto ao artigo que permitiria às empresas escapar do pagamento de direitos trabalhistas aos empregados - pelo artigo vetado, os empregadores nas ZPEs poderiam, "por acordo", deixar de pagar obrigações previdenciárias, por exemplo. Mas a indústria paulista opõe-se categoricamente à possibilidade de venda de produtos dessas companhias no mercado interno, item mantido por Lula, apesar das especulações de que modificaria esse ponto na lei.
"Se o Brasil não consegue nem controlar as fronteiras, os portos e aeroportos, esse artigo abre mais portas para irregularidades, para competição desleal", acusa o presidente da Fiesp, Paulo Skaf. "A indústria no país já sofre a concorrência predatória de produtos importados fraudulentamente e será ameaçada por mercadoria estrangeiras ou produzidas no país sem pagamento de imposto vendidas irregularmente a partir dessas ZPEs."
Skaf argumenta que as ZPEs são "desnecessárias nesse momento". Foram sugeridas, nos anos 90, como uma maneira de trazer mais dólares ao país, algo que atualmente perdeu a razão de ser. Ele atribui a aprovação do projeto a pressões políticas e diz não ver racionalidade econômica na criação dessas Zonas em momento de tamanha desvalorização do dólar no mercado nacional.
Para os defensores das ZPEs, essas zonas ajudariam a trazer tecnologia mais avançada, descentralizar a produção industrial brasileira e seguir o modelo bem-sucedido da China, onde são um dos motores do sucesso exportador do país. "Se é para copiar a China, vamos então trazer para cá a política de juros reais negativos", contra-argumenta Skaf, que promete agir no Congresso para limitar ao máximo o alcance dos prometidos benefícios fiscais da nova lei.
A lei, com vetos, autoriza a criação de ZPEs em "regiões menos desenvolvidas", por decreto do Executivo e administradas por um Conselho Nacional das ZPEs. Lula vetou o artigo que o obrigaria a promover, na estrutura do conselho, "representação dos Estados, municípios e empresas administradoras de ZPEs". A ampliação da composição do conselho é iniciativa privativa da Presidência, argumentou o presidente, que usou o mesmo argumento para eliminar a exigência de regulamentação da lei em 60 dias.
Lula vetou também as isenções de impostos indiretos (IPI, Cofins, Pis-Pasep, IOF), sob o argumento de que, como pode haver venda de mercadorias no mercado interno, o governo deve, apenas, suspender a cobrança de impostos, como faz em outros regimes de exportação. Lula vetou, na lei, as isenções de pagamento de Imposto de Renda (IR), que poderia chegar a 10 anos para empresas em ZPEs de alguns Estados. O veto, nesse caso, deixa claro que nem uma possível regulamentação da lei dará incentivo com IR, o que poderia abrir porta para competição desleal com empresas instaladas em outras partes do país. Também vetou-se o tratamento cambial diferenciado na compra de mercadorias, gás e energia elétrica, para empresas nas ZPEs.
No texto enviado para publicação, hoje, no Diário Oficial, Lula cita apenas uma vez os riscos aos compromissos internacionais do país. As ZPEs, como demonstra a preocupação dos argentinos, abre enorme flanco de contestação às exportações brasileiras, e desmoraliza o país na arena internacional. "O Brasil vai ser questionado no Mercosul e na Organização Mundial do Comércio", prevê o embaixador Rubens Barbosa. "Vai criar problemas com nossos sócios".
Com as ZPEs, o Brasil, que enfrenta descontentamento do Uruguai e Paraguai, conseguiu incomodar os argentinos, com quem, após muito trabalho e atritos, havia conseguido firmar um pacto de boa convivência.
Fonte: Sergio Leo - Valor