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Vício de origem prejudicou estudos de impacto ambiental de hidrovia no Pará

Audiência coordenada pela CUT com procuradores do MPF e MPT do Pará e Movimento em Defesa do Rio Tocantins aponta atraso na entrega de documentos para estudos sobre impactos ambientais da obra

Publicado: 01 Setembro, 2021 - 18h30 | Última modificação: 01 Setembro, 2021 - 20h00

Escrito por: Wanderson Lobato, especial para o Portal CUT

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O processo de licenciamento ambiental da hidrovia Araguaia Tocantins possui um “vício de origem” que prejudicou o levantamento dos impactos socioambientais da obra na região. Esta foi uma das questões apontadas na reunião virtual realizada nesta terça-feira (1°) entre procuradores do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho de Marabá, no sul do Pará, com a comissão do Movimento em Defesa do Rio Tocantins.

Igor Lima Goettenauer de Oliveira, Procurador da República que acompanha o processo de licenciamento ambiental da hidrovia, em tramitação no IBAMA, explicou que para a elaboração do termo de referência que orienta os estudos de impacto da obra é necessário que seja preenchida a ficha de caracterização da atividade, documento que caracteriza o empreendimento, dando as informações necessárias para que o instituto possa dimensionar os impactos ambientais e elaborar os questionamentos necessários para serem respondidos pelo empreendedor antes de licenciar o projeto.

 

Igor Lima Goettenauer de Oliveira, Procurador do MPF

 

No entanto, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (DNIT), responsável pela obra, dois anos após a elaboração do termo de referência para os estudos de impacto ambiental da hidrovia ainda não preencheu a ficha, segundo informação repassado ao MPF pelo IBAMA.

“Então, o termo de referência que pautou a elaboração do estudo de impacto ambiental foi feito sem sequer ter sido dimensionado, de maneira adequada, quais seriam os impactos da hidrovia na vida das populações locais”, informou o procurador.

Já Adriano Lanna de Oliveira, responsável pela Procuradoria que trata das questões envolvendo povos tradicionais, contou que em junho enviou recomendação para o Ibama suspender o processo de licenciamento ambiental da hidrovia até que seja realizada a consulta prévia, livre e informada das comunidades ribeirinhas atingidas pelas obras, conforme a Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho.

 

Adriano Lanna de Oliveira, Procurador do MPF

 

O órgão ambiental respondeu ao MPF que, no seu entender, a Convenção se aplica apenas aos povos indígenas, desobrigando o governo de realizar a consulta junto aos outros povos tradicionais da região, como os quilombolas e ribeirinhos. O procurador, então, encaminhou questionamento à Procuradoria Federal vinculada ao IBAMA questionando se havia algum respaldo jurídico para a decisão.

Segundo Lanna, caso a resposta seja de que não há respaldo, será possível responsabilizar o Ibama e os servidores que tiveram esse entendimento e "até levar o caso à Procuradoria Geral para constrangê-los e obrigá-los a fazer a oitiva. Caso o posicionamento tenha algum respaldo jurídico o único encaminhamento possível é a judicialização”.

Coordenada pela Secretária-Geral da CUT Nacional, Carmen Foro, a audiência com o MPF foi solicitada pela central sindical, uma das entidades à frente do Movimento em Defesa do Rio Tocantins, que tem a participação de instituições e organizações sociais, sindicais, religiosas e de ensino e pesquisa dos municípios localizados tanto à jusante (localizados próximos da foz) quanto à montante (próximo da nascente) do rio.

Carmen afirmou que o Movimento em Defesa do Rio Tocantins, em breve, deve lançar uma campanha internacional em defesa do rio e que vai procurar também a Procuradoria da República em Belém, responsável pelos processos envolvendo os municípios à jusante do rio (na região conhecida como Baixo Tocantins) para pressionar pela realização dos estudos de impacto ambiental nos municípios desconsiderados no EIA-Rima do empreendimento.

A dirigente também informou que a CUT Brasil possui assento no Conselho de Adninistração da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e citou aa Convenção 169, que trata dos direitos fundamentais dos povos indígenas e tribais. Ela pediu apoio aos procuradores sobre quais medidas podem ser tomadas para que o governo brasileiro siga as recomendações do tratado internacional, “uma vez que a lógica internacional da Convenção inclui ribeirinhos e quilombolas”, afirmou.

 

Carmen Foro, Secretária-Geral da CUT

 

Segundo o procurador Adriano Lanna, o fato de a CUT participar do Conselho da OIT “abre possibilidade de se tentar buscar uma responsabilização do Estado Brasileiro pela não aplicação ou pela interpretação indevida da Convenção 169, levando em consideração que o Brasil é signatário”, afirmou.

Para a Secretária-Geral da CUT a reunião foi bastante proveitosa e demonstrou a força dos povos da região unidos pelo rio e em sua defesa.

“Entendemos que é preciso fazer o estudo dos impactos desses municípios que não são considerados impactados e compreendemos também que temos que pressionar o IBAMA para garantir que a Convenção 169 seja implementado na sua íntegra considerando povos tradicionais não só indígenas, mas quilombolas, ribeirinhos e os povos que atuam a margem do rio.”