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Superfaturamento de preços de hotéis para a COP 30 dificulta realização do evento

Central alerta que especulação em hotéis de Belém para COP 30 ameaça a presença de participantes da sociedade civil e cobra ação do poder público para controlar preços

Publicado: 18 Agosto, 2025 - 15h26

Escrito por: André Accarini

Fernando Frazão / Agência Brasil
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O superfaturamento nos preços de hospedagem para a COP 30, marcada para ocorrer em Belém do Pará em novembro deste ano, tornou-se a principal preocupação de movimentos sociais e entidades da sociedade civil. A prática, que já eleva tarifas de hotéis em até 20 vezes o valor normal, ameaça a participação popular na conferência e o caráter democrático do evento. Para as organizações, além de dificultar a presença de delegações da sociedade civil, especialmente de regiões distantes e do exterior, a especulação pode enfraquecer a pressão por pautas essenciais, como a transição justa, nas negociações oficiais.

Um dos principais pontos de crítica está relacionado ao setor hoteleiro da capital paraense. Desde a confirmação de Belém como sede da COP 30, o mercado passou a praticar preços considerados abusivos. O secretário de Relações Internacionais da CUT, Antônio Lisboa vê com preocupação a situação e afirma que o superfaturamento dos preços, por parte da iniciativa privada – os hotéis – está prejudicando o evento.

“Infelizmente, o que estamos vendo hoje é que os preços em hotéis estão 10, 15, até 20 vezes mais altos que o valor normal. Isso prejudica fortemente a presença de muitas pessoas que esperavam uma COP no Brasil com ampla participação social”, disse Lisboa

Por outro lado, ao não estabelecer diretrizes para conter os valores cobrados pela rede de hospedagem, os poderes públicos acabaram permitindo uma lógica de especulação que dificulta a chegada de representantes da sociedade civil, especialmente de outros países ou de regiões distantes da Amazônia. A alta nos preços compromete, segundo o dirigente, o caráter plural e democrático que se espera da edição brasileira da conferência.

Participação da CUT e mobilização popular

Apesar dos obstáculos logísticos, a CUT já confirmou sua participação na COP 30, inclusive com a mobilização das suas bases na região amazônica. A central também atua na articulação da Cúpula dos Povos, espaço que ocorre paralelamente à agenda oficial da ONU e que reúne movimentos sociais, organizações não governamentais e ativistas ambientais de todo o mundo.

“A Cúpula dos Povos será um espaço fundamental para que a sociedade civil possa incidir sobre os resultados da COP. Ali, os movimentos sociais apresentarão suas posições e pressionarão para que as decisões considerem os interesses dos povos e dos trabalhadores”, afirmou o secretario de relações Internacionais da CUT.

Medidas adotadas

Governo federal e governo do Pará têm tentado adotar alternativas para atenuar a situação. Entre elas a contratação de navios-cruzeiro e a criação de uma plataforma oficial de hospedagem. A plataforma centraliza reservas com tarifas mais acessíveis para países em desenvolvimento.

Os navios contratados ficarão atracados em Belém e vão oferecer 3.900 cabines e 6.000 leitos, complementando a oferta hoteleira existente.

A plataforma online, desenvolvida foi lançada para centralizar as reservas de hospedagem e facilitar o acesso dos participantes. O governo estabeleceu um plano que prioriza as delegações participantes das negociações oficiais, oferecendo 2.500 quartos com tarifas entre US$ 100 e US$ 600.

O presidente da COP 30, embaixador André Corrêa do Lago, já descartou mudança na sede da Conferência da ONU sobre Mudança do Clima, prevista para novembro. O embaixador, no início do mês, chegou a admitir que países haviam pressionado o governo brasileiro para transferir a sede da COP 30 pesar dos atuais problemas de reservas de hospedagem em Belém.

Transição justa como prioridade sindical

Uma das principais bandeiras do movimento sindical internacional nas negociações climáticas é o conceito de transição justa — processo que busca garantir que as mudanças necessárias na economia para conter o colapso climático não penalizem trabalhadores e comunidades vulneráveis. A pauta já foi incorporada a um programa de trabalho da ONU, aprovado na COP 28, e agora a expectativa é que o tema ganhe centralidade na edição brasileira da conferência.

“O movimento sindical internacional tem como centro estratégico a transição justa. E o que vemos, nas conversas com a presidência brasileira da COP, é que esse tema estará incorporado em todo o debate oficial”, destacou Antonio Lisboa. A expectativa da entidade é que essa perspectiva não apenas esteja presente no discurso, mas se traduza em compromissos concretos durante as negociações.

Tarifas dos EUA, extrema-direita e geopolítica

Para Lisboa, a ofensiva do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil está diretamente ligada à sua estratégia de reeleição e de fortalecimento da extrema-direita global. “O que ele quer é criar as condições para vencer as eleições legislativas nos EUA e depois ter maioria para mudar a Constituição e se tornar novamente elegível. E o Brasil é peça-chave nisso, com Bolsonaro sendo um ponto de apoio na América do Sul.”

Ele argumenta que a relação entre Trump e a família Bolsonaro, em especial com o deputado federa Eduardo Bolsonaro, faz parte de uma rede articulada da extrema-direita mundial, da qual participam também figuras como Steve Bannon.

“Negar que a família Bolsonaro tem influência nisso é simplificar as coisas. Bolsonaro é uma das principais lideranças da extrema-direita global e o que eles estão fazendo é colocar os interesses pessoais acima da soberania nacional.”

Riscos à soberania brasileira

Para a CUT, os acontecimentos recentes reforçam a importância de discutir soberania e autodeterminação nos fóruns internacionais. E a COP 30, ao ocorrer no coração da Amazônia, tem simbolismo especial nesse contexto.

“A escolha de Belém foi extremamente importante exatamente por se tratar de uma cidade no centro da região amazônica. Mas é preciso garantir que a COP seja de fato um espaço de construção coletiva, e não um evento esvaziado pela lógica de mercado.”

A central conclui que, para que a conferência cumpra seu papel, é preciso enfrentar os interesses econômicos e geopolíticos que dificultam o avanço das pautas ambientais e sociais, e garantir a presença ativa da sociedade civil, dos trabalhadores e dos povos tradicionais da região amazônica.