Gastos com juros atingem 5,78% do PIB
Relatório de Política Fiscal publicado pelo BC comprova prioridade nos gastos públicos com exorbitante transferência aos bancos
Publicado: 02 Maio, 2012 - 15h19
O Relatório de Política Fiscal referente a março, publicado pelo Banco Central (BC) no dia 27, com os gastos públicos com juros e a verba pública desviada para esses gastos (o “superávit primário”), evoca um outro lado da questão: como estão os gastos do governo com juros em relação às outras despesas.
Em resumo, a Execução Orçamentária, até 28 de abril, percentualmente, foi a seguinte:
1) Juros e encargos da dívida pública – tinham sido gastos 35,91% do total autorizado no Orçamento para o ano de 2012.
2) Amortização e refinanciamento da dívida – gastos 36,45% do total para 2012.
3) Pessoal e encargos sociais – pagos 25,80% do total autorizado no Orçamento.
4) Despesas correntes – pagos 24,26% do total autorizado.
5) Investimentos – liberados 1,76% do total destinado pelo Orçamento (em relação ao total de gastos do governo, até 28 de abril, os investimentos eram 23,09% dos gastos, enquanto os juros, amortizações e refinanciamento da dívida eram 59,44% dos gastos do governo – cf. LOA 2012 - Execução Orçamentária por Grupo Natureza de Despesa – GND, at. 28/04/2012).
Não é necessário fazer comentários sobre o que é evidente: a prioridade nos gastos públicos, apesar dos esforços da presidente Dilma, é, ainda, com as exorbitantes transferências aos bancos, especialmente o gasto com juros. As despesas de custeio (“despesas correntes”), um dos esteios do crescimento no governo Lula, foram cortadas não para aumentar os investimentos (que foi onde menos se gastou), mas para aumentar o amealhamento de dinheiro público pelos bancos.
No entanto, ou por isso mesmo, os bancos privados continuam sem atender aos apelos da presidente Dilma para que reduzam seus juros. O problema é que eles estão escorados pela taxa básica de juros, ainda muito alta, que remunera os títulos públicos, pois 67,7% da dívida pública líquida – R$ 1,04 trilhão - está indexada pela taxa básica, a Selic (cf. BC, Relatório de Política Fiscal, tabela X).
Enquanto os bancos ganharem um delírio de dinheiro na especulação garantida pelos títulos públicos com uma alta taxa básica, não vão baixar seus juros para aumentar o crédito às empresas e ao consumidor. Para que ter o trabalho de emprestar, se podem ganhar dinheiro muito mais facilmente e sem riscos? No máximo, farão a encenação que estão fazendo – e nada mais.
A taxa básica de juros do BC, portanto, é a taxa básica da especulação. A prova, se fosse necessária mais alguma, é o próprio Relatório de Política Fiscal do BC.
Por ele sabemos que, em março, o setor público gastou R$ 21 bilhões em juros (o governo federal sozinho gastou R$ 18,2 bilhões). Desde janeiro, esse gasto foi de R$ 59 bilhões (governo federal = R$ 52,4 bilhões). Em 12 meses, desperdiçou-se em juros R$ 236,7 bilhões (governo federal = R$ 206 bilhões).
Esse gasto corresponde, desde janeiro, a 5,78% do PIB - o valor “adicionado”, isto é, produzido no país pela indústria, agricultura e pelos serviços - e a 5,64% do PIB em 12 meses.
Ressalte-se que o BC está baixando a taxa de juros básicos desde agosto, depois dos desastrosos cinco aumentos seguidos a partir de janeiro de 2011. No entanto, isso não baixou o gasto com juros; o gasto de janeiro a março foi o mesmo em 2011 e 2012; o gasto em 12 meses, mesmo descontada a inflação, cresceu (de R$ 208,9 bilhões em março de 2011 para R$ 236,7 bilhões em março de 2012) – o que é um efeito ainda dos aumentos de juros do ano passado e, em seguida, da opção do BC pela homeopatia nas reduções da taxa.
Liberar, em quatro meses, apenas 1,76% da verba destinada a investimentos orçamentários, numa situação em que a economia está perigosamente estagnada, ou pior que isso (tanto é assim que o governo já lançou seis pacotes com medidas de “incentivos”), parece coisa de maluco ou de suicida – mais ainda porque, dos recursos orçamentários previstos para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em 2012 (ao todo, R$ 42,58 bilhões), até o dia 28 de abril a Execução Orçamentária só registrava a liberação de R$ 412,33 milhões, o que é 0,97% do total para o ano. A parcela é tão pequena que conferimos várias vezes esses números, porque, a princípio achamos que era impossível. No entanto, é isso o que consta no Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal – cf. LOA 2012 - Execução Orçamentária das despesas do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, 28/04/2012).
No entanto, R$ 46 bilhões, no primeiro trimestre, foram desviados da Saúde, Educação, etc., para o gasto com juros (contra R$ 39,3 bilhões no mesmo período do ano passado). Logo, o desvio para juros, também chamado “superávit primário”, foi, em três meses, 111,5 vezes a verba liberada para o PAC em quatro meses. Em 12 meses, foram desviados R$ 135,4 bilhões do Orçamento para juros (contra R$ 121,9 bilhões em 2011).
O famigerado “superávit primário”, mero desfalque do que deveria ser aplicado no atendimento ao povo, aumentou +17,04% no primeiro trimestre em relação ao mesmo trimestre de 2011, e +11, 07% em 12 meses. E mesmo assim, como de costume, esteve longe de cobrir o gasto com juros. Pelo contrário, o chamado “déficit nominal” (diferença entre o “superávit primário” e o gasto com juros) aumentou para R$ 10,6 bilhões, quando em março do ano passado estava em R$ 6,9 bilhões. O interessante (pela indignidade) é que o sr. Mantega aumentou o superávit primário exatamente com o argumento de que o “déficit nominal” necessita – sabe-se lá quando – ser zerado.
Há quem fique eufórico com esse assalto dos bancos à verba pública. Sem querer ofender os ingênuos, pois sempre os há, é preciso ter espírito de ladrão para ficar alegre com um roubo. Sobretudo quando é o Brasil e o seu povo, nós, que estamos sendo roubados.