Curto-circuito mata 17 pessoas. Sindicato...
Famílias das vítimas ainda sem indenização. Empresa do governo mineiro alega danos à sua imagem
Publicado: 01 Novembro, 2011 - 17h29
Escrito por: Isaías Dalle
No dia 27 de fevereiro deste ano, numa festa pré-carnavalesca de rua em Bandeira do Sul, cidade de 5.400 habitantes a 400 km de Belo Horizonte, um acidente envolvendo a rede elétrica eletrocutou e matou 17 foliões, a maioria jovens e adolescentes.
A tragédia, que foi exibida pelos meios de comunicação do Brasil inteiro, foi atribuída naquele dia unicamente ao fato de uma inocente serpentina de alumínio ter atingido um dos fios da rede aérea. O curto-circuito que se seguiu derrubou os fios ao chão e a descarga de mais de 7 mil volts atingiu quem estava próximo ao carro de som. O céu ainda estava claro nesse momento. Pelas contas dos organizadores da festa pré-carnavalesca, havia cerca de 5 mil pessoas no evento, quase a população inteira da cidade
Passado o pânico, enquanto todos, incluindo a imprensa e as autoridades, tentavam explicar o que ocorrera, o SindieletroMG-CUT (Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais) denunciou o mau estado de conservação da rede daquela cidade, apontando inclusive vários remendos na fiação – o que indicaria claramente rompimento anteriores de fios – como uma das possíveis causas do acidente.
Jairo Nogueira Filho, coordenador do sindicato
O coordenador geral do sindicato, Jairo Nogueira Filho, afirmou à imprensa que se a rede fosse mais moderna, a transmissão de energia se interromperia automaticamente ao ser tocada pela serpentina e o acidente poderia ter sido evitado. “Com as novas tecnologias, o cabo não se romperia com tanta facilidade, por causa de um curto-circuito, e a energia seria desligada”, afirmou Jairo ao portal “Minas Livre”, no dia seguinte ao acidente.
Familiares ainda sem indenização
Hoje, nove meses depois, os familiares dos mortos e feridos ainda não receberam nenhuma indenização, mas a Cemig, empresa responsável pelo sistema de energia elétrica de Minas, já encontrou culpados por parte dos estragos provocados pela tragédia.
A empresa está processando o SindieletroMG e seu coordenador geral, sob a alegação de que a entidade sindical e o dirigente em pessoa causaram danos à imagem da companhia de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, ao apontarem os problemas na manutenção da rede na cidade de Bandeira do Sul.
A Cemig, em resposta a questionamento do Portal do Mundo do Trabalho, disse esperar que o juiz do caso defina qual a punição merecida pelo sindicato, na hipótese de vencer a ação. A empresa quer a reparação dos “danos”.
Rede da cidade passa por manutençãoJairo, coordenador do sindicato, afirma estar tranquilo e que a entidade não será condenada. “O que eu disse em todas as entrevistas é que se a rede fosse mais moderna, talvez não tivesse ocorrido o acidente. Além disso, o alerta sobre as más condições da rede não só de Bandeira do Sul, mas de vários pontos do Estado, já vinha sendo dado por nós há muito tempo, bem antes do acidente”, afirma ele.
Além disso, há fatos que corroboram a versão do SindieletroMG. A rede da cidade de Bandeira do Sul tem mais de 40 anos de uso. Trabalhadores que operam no sistema local informaram que o equipamento de segurança conhecido como secionador (que corta a energia em caso de emergência) estaria fora de serviço no dia do acidente. Outra evidência de problemas é o fato de a Cemig ter depois reformado a rede da cidade, no mês de setembro.
Parte da confiança demonstrada pelo coordenador vem também do apoio que o sindicato vem recebendo de diversos deputados na Assembleia Legislativa e, especialmente, de outras entidades sindicais de todas as partes do País.
População não compra versão da empresa
Quando do acidente, o sindicato reivindicou uma auditoria independente, de preferência de uma universidade, em que técnicos do setor fizessem o diagnóstico das causas da tragédia. Apesar disso, a investigação coube apenas à polícia civil do Estado de Minas Gerais, que a encerrou sem identificar culpados.
Segundo Jairo, os moradores da cidade não se conformam com esse resultado e por isso aderiram em peso a abaixo-assinado, iniciativa do deputado estadual Pompilio Canavez (PT), que pede nova investigação, dessa vez feita por órgão independente.
Enquanto isso, a indenização aos familiares das vítimas do acidente depende da tramitação de um projeto de lei, ainda não aprovado.
Perseguição política
Jairo Nogueira Filho, eletricista da Cemig há 23 anos, casado e pai de duas filhas, aponta outra razão para a Cemig ter aberto processo judicial contra ele e o sindicato. “Em Minas está em curso uma perseguição política ao movimento sindical que não é alinhado ao governador Antonio Anastasia e ao PSDB”. Jairo relata que o SindieletroMG, assim como tantos outros, apoiou politicamente a recente greve de 112 dias feita pelos educadores mineiros – que pediam o respeito ao Piso Nacional do Magistério – e isso vem gerando retaliações.
“Um dirigente da Cemig, em tom irônico, me chamou de ‘professor’ durante uma mesa de negociação. Ele também disse claramente que não achava de bom tom que uma categoria se envolvesse nas negociações de outra”, relata o coordenador. Jairo refere-se ao presidente da empresa, Djalma Morais.
Em resposta por email, a assessoria de comunicação da empresa nega que haja influência política na decisão de processar o sindicato: “Não houve qualquer tipo de pressão política (...) Precisa ficar bem claro que a Cemig é uma empresa de economia mista, com ações em bolsa. Apenas cerca de 25% de todas as ações pertencem ao governo de Minas. Se a empresa não agisse dessa forma ficaria realmente como culpada pelo acidente. Isso mancha a imagem de uma empresa pública”. A Cemig também diz que, se houve pressão política, “isso ocorreu por parte dos dirigentes dos sindicatos que usaram deputados para agredir a imagem da Cemig”.
No entanto, o site da Cemig informa, em seu link “estrutura societária”, que o “Estado de Minas Gerais” tem 50,96% das ações ordinárias da empresa. Confira aqui.
Na base do SindieletroMG há 8.900 mil trabalhadores diretos e mais de 15 mil terceirizados, a maioria em atividades-fim, informa Jairo. Segundo ele, essa situação tem gerado uma morte de trabalhador da empresa a cada 45 dias, entre os anos de 2010 e 2011.
Assista a imagens do momento do acidente: