Artigo de Beto Almeida
João Cândido, petróleo, racismo e emprego
Publicado: 11 Maio, 2010 - 22h45
Escrito por: CUT
Em artigo precioso epreciso, o jornalista Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília, falada inauguração do navio petroleiro João Cândido, da homenagem ao AlmiranteNegro, à classe trabalhadora e ao Brasil, enfatizando o significado maior dasoberania e da altivez com que passaremos a singrar os mares, demarcandocampo com o neoliberalismo entreguista dos que promoveram o criminoso desmonteda nossa indústria naval.
JoãoCândido, petróleo, racismo e emprego
Sexta-feira (7/5) aTranspetro lançou ao mar o navio petroleiro João Cândido. Batizado com o nomede um dos nossos heróis, marinheiro negro, filho de escravos e líder da Revoltada Chibata, o navio tem 247 metros de comprimento, casco duplo que previne acidentee vários significados históricos. Primeiro, leva a industrialização paraPernambuco, contribuindo para reduzir as desigualdades regionais. Em segundolugar, dá um cala-boca para quem insinuou de forma maldosa que o PAC era apenasvirtual. Em terceiro, prova que está em curso a remontagem da indústria navalbrasileira criminosamente destruída na era da privataria.
Como um simbolismoadicional, um total de 120 operários dekasseguis foram trazidos do Japão, comsuas famílias, para juntarem-se aos operários nordestinos que construíram onavio. Os primeiros não precisam mais morar longe da pátria; os outros, saem docanavial para a indústria e não precisam mais pegar o pau-de-arara, nem entoarcom amargura a Triste Partida, de Patativa do Assaré, como um certopernambucano teve que fazer na década de 50. Até que virou presidente.
Mulheres trabalhando comochefes de equipe de soldagem no Estaleiro Atlântico Sul, no município deIpojuca, em Pernambuco, pronunciavam frases orgulhosas lembrando que não sabiamnem que esta também poderia ser uma tarefa feminina. O ex-pescador decaranguejo contava em depoimento agreste que antes do estaleiro não sabiadireito como ganhar o sustento da família a cada dia que acordava. Oex-canavieiro, agora operário, destaca que não depende mais temporalidadeinsegura da colheita da cana e quando acorda já tem para onde ir, quando antesvivia a insegurança. Estes alguns dos vários depoimentos colhidos nainauguração do navio petroleiro João Cândido ao ser lançado ao mar pernambucano.Deixa em terra um rastro de transformação.
Inicialmente, na vidadestas pessoas antes lançadas ao deus-dará de uma economia nordestinareprimida, desindustrializada. A transformação atinge os municípios maispróximos, pois no local onde foi construído o estaleiro, uma antiga moradora,Mônica Roberta de França, negra de 24 anos, que foi escolhida para ser amadrinha do navio, dizia que ali era um imenso areal, não tinha nada. Agora temuma indústria e uma escola técnica para os jovens da região. E que só agora elatem seu primeiro emprego na vida com carteira assinada.
Desculpasà Nação
Para o governador dePernambuco, Eduardo Campos, o lançamento do João Cândido ao mar tem o mesmoalcance histórico do gesto de Getúlio Vargas quando deu forte impulso ànacionalização da indústria naval brasileira, na década de 30, por meio daempresa de navegação estatal. “Aqueles que destruíram a indústria naval tem queassumir sua responsabilidade e pedir desculpas à Nação”, disse Campos nasolenidade que teve a participação de 5 mil pessoas aproximadamente, sobretudodos operários.
O Navio João Cândido abreuma nova rota para a economia brasileira. Inicialmente, porque a Petrobrás jánão será obrigada a desembolsar cerca de 2,5 bilhões de reais por ano com oafretamento de navios estrangeiros. Há, portanto, um revigoramento do papel doestado na medida em que a reconstrução da indústria naval brasileira éresultado direto de encomendas da nossa empresa estatal petroleira. O quetambém permite avaliar a gravidade e o caráter antinacional das decisões quelevaram um país com a enorme costa que possui, tendo montado uma economia navalde peso internacional respeitável, retroceder em um setor tão estratégico.
E isso quando nossaeconomia petroleira, há anos, já dava sinais de expansão, mesmo quando estavamno poder os que promoveram o espantoso sucateamento, a desnacionalização e aabertura da navegação em favor dos países que querem impedir nossodesenvolvimento. Este tema, certamente, não poderá faltar nos debates da campanhapresidencial deste ano.
Almirantenegro
A escolha do nome JoãoCândido também foi destacada na solenidade por meio do novo ministro daSecretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, Eloy Moreira. Valeregistrar que há pouco mais de um ano Lula participou de homenagem ao AlmiranteNegro inaugurando sua estátua na Praça XV, no Rio, que estava há anos guardada,supostamente porque não teria havido grande empenho da Marinha na realizaçãodesta solenidade. Pois bem, agora João Cândido não está apenas nas “pedraspisadas do cais”, com diz a maravilhosa canção de Bosco e Blanc. Está naestátua e está cruzando mares levando para o mundo afora o nome de um de nossosheróis.
Navegaré possível
O novo petroleiro estatal,portanto, é uma prova real de que sim “navegar é possível”, como dizia umafaixa no ato. Navegar na rota inversa daquela que promoveu o desmantelamento danossa indústria naval. Navegar na rota da revitalização e qualificação do papelprotagonista do estado. Recuperar um curso que havia sido fundado lá durante aEra Vargas onde se combinava industrialização e nacionalização com geração deempregos e direitos trabalhistas. Se no período neoliberal foi proclamada aidéia de destruir a “Era Vargas”, agora, está não apenas proclamada, mas já colocadaem marcha, a necessidade de reconstruir a partir dos escombros da ruína dasprivatizações - entulho neoliberal - tendo no dorso no navio-gigante o nomeheróico do líder da Revolta da Chibata. Sem revanchismo, o episódio permitelembrar outra canção: “É a volta do cipó de aroeira no lombo de quem mandoudar”.