Juro alto e dólar baixo: alimento dos parasitas, motores da desindustrialização
Publicado: 01 Setembro, 2011 - 00h00
Defender o mercado interno, com uma política de valorização do trabalho e distribuição de renda, ampliação de investimentos públicos e das políticas sociais é, para a Confederação Nacional dos Trabalhadores no Setor de Couro, Calçado e Vestuário da CUT (CNTV) o principal desafio a ser enfrentado neste momento de aprofundamento da crise internacional, que afeta com gravidade a Europa e os Estados Unidos.
Como já temos alertado há algum tempo, a atual política econômica está indo na contramão das necessidades do país, se mostrando extremamente perversa ao combinar os mais altos juros do mundo – mesmo com a tímida redução recente - com dólar baixo. Isso tem provocado uma verdadeira devastação na nossa economia, pois ao mesmo tempo em que alimenta irresponsavelmente o parasitismo dos bancos e especuladores, alavanca o importacionismo.
Infelizmente, ao não colocar freio às importações nem controlar o câmbio, o governo acaba tornando o produto nacional mais caro e o produto estrangeiro mais barato, provocando imensos danos ao país e aos trabalhadores.
Conforme a Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (PIMES), divulgada pelo IBGE no dia 11 de agosto, o fantasma do desemprego começou a ganhar corpo: queda de 0,2% no emprego em junho. Comparado ao primeiro semestre do ano passado, caiu ainda mais: 2% no setor de calçados e couro; 3,1% no vestuário; 7,8% na madeira e 9% no setor de papel e gráfica.
Embora para estes setores, o Plano Brasil Maior tenha dado uma compensação – sem contrapartidas sociais, diga-se de passagem - via desoneração de 100% sobre as contribuições para a Seguridade Social, em troca de 1,5% do faturamento para, parcialmente, substituir as fontes constitucionais de financiamento da Seguridade e da Previdência. Na prática, como alertam as próprias empresas, os ganhos advindos desta desoneração são integralmente perdidos pela combinação juro alto-dólar baixo. Por outro lado, como atestam os técnicos, o governo precisará injetar recursos públicos para não descapitalizar a Previdência. Ou seja: um tiro na água.
Soma-se a esta tragédia a inação do governo frente à invasão de importados chineses, estimulada pela valorização artificial do Real. Esta é a principal causa das demissões nas fábricas de calçados que empregam mais de 850 mil trabalhadores com carteira assinada.
Assim o primeiro semestre fechou com uma alta de 50% nas importações e uma queda de 27,6% nas exportações do setor calçadista. No total, foram pagos US$ 217,3 milhões pelos produtos importados em comparação com igual período do ano anterior. Os valores são resultado da compra de 19,2 milhões de pares.
Segundo a Abicalçados, este crescimento é puxado, principalmente, por países que não têm tradição como fornecedores ao Brasil, o que aponta para a prática ilegal da “triangulação”. Ou seja, como os produtos chineses estão sendo monitorados, o país está utilizando terceiros como laranjas – transformados em plataforma de exportação - para desovarem a sua produção em território nacional. É o caso da Indonésia - cujo aumento foi de 125% em relação ao primeiro semestre de 2010, o que corresponde à aquisição de 2,8 milhões de pares.
Este drible real na fiscalização virtual pode tornar inóqua a mobilização realizada por trabalhadores e empresários para a adoção de medidas antidumping nas importações de calçados oriundos da China. Com nossa ação conseguimos a sobretaxação dos produtos vindos daquele país, o que possibilitou a recuperação de 40 mil empregos perdidos no último trimestre de 2008. Vale lembrar que, no ano passado, a China contabilizou oficialmente a exportação de cerca de 38 milhões de pares de calçados, enquanto o Brasil registrou o ingresso de pouco mais de 9 milhões de pares de calçados de origem chinesa.
Mas ao mesmo tempo em que atuamos junto aos empresários em defesa da produção nacional, alertamos o governo para a necessidade de que cobrem destas mesmas empresas contrapartidas sociais, trabalhistas e ambientais, sem o que os trabalhadores continuarão à mercê da lógica privada, das metas abusivas que exigem um ritmo intenso de trabalho, de longas e extenuantes jornadas, da precarização laboral e seus salários indecentes. Vamos fazer a nossa parte na luta sindical contra o capital, obviamente, mas precisamos que quando o governo disponibilizar recursos públicos, que estejam vinculados a melhorias concretas nas condições de vida e trabalho.
O último período demonstrou ser bastante penoso e insalubre para as condições de saúde e segurança dos trabalhadores, com a multiplicação das lesões por esforço repetitivo e mutilações dando lugar a uma nova doença, invisível mas igualmente perturbadora e trágica: a depressão, afetando com ainda mais gravidade as mulheres, além de outros transtornos mentais como síndrome do pânico e esquizofrenia.
Algo extremamente grave quando são doenças que acabam se manifestando não mais dentro do chamado chão da fábrica, junto a outros trabalhadores, mas na solidão das casas e porões convertidos em local de trabalho pelas terceirizações e quarteirizações. Ou seja, o acidente de trabalho, as seqüelas do trabalho, saíram da empresa e foram para o domicílio, individualizando o problema e tornando, portanto, muito mais difícil sua solução.
Há necessidade, portanto, de agregar ao debate sobre a terceirização e quarteirização este fenômeno altamente daninho e que tem se expandido com mais intensidade no Ramo do Vestuário, com perdas expressivas para a saúde física e mental de seus trabalhadores.