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Decreto que regula uso da força policial pode ajudar a pôr um fim à violência policial desmedida

Publicado: 20 Janeiro, 2025 - 00h00

Assinado pelo presidente Lula em 23 de dezembro de 2024, foi publicado no Diário Oficial o Decreto nº 12.341/2024, regulamentando a Lei nº 13.060, de 22 de dezembro de 2014, para disciplinar o uso da força e dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos profissionais de segurança pública, com vistas a promover eficiência, transparência, valorização dos profissionais de segurança pública e respeito aos direitos humanos.

A supracitada lei demorou dez anos para ser regulamentada, o que por si só revela as restrições que lhe foram impostas neste período. Sobre este tema tramitam na Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial (CDHMIR) 24 proposições, que dispõem sobre o exercício da atividade policial, disciplinando o uso da força ou de arma de fogo.

A Central Única dos Trabalhadores se coloca ao lado e apoia a iniciativa do Ministro Enrique Ricardo Lewandowski, que construiu o decreto através de um processo de discussão amplo, envolvendo lideranças e especialistas de todo o país. São muitos os interessados nesta questão. De um lado, as classes populares, jovens, negros e negras, a população LBGTQI+ e todos os “desclassificados da modernidade” ou “indesejáveis”, que são as maiores vítimas da violência policial em nosso país. De outro, as forças de extrema direita, aglutinadas em torno da “Bancada da Bala”, acostumadas a primeiro atirar para depois perguntar, como tem se tornado rotina nas periferias das grandes cidades.

Episódios não param de revelar a relevância deste decreto. Não podemos jamais esquecer e deixar de considerar casos como da jovem Juliana Rangel, de 26 anos, que foi baleada na cabeça por policiais da PRF na BR-040, quando a família passava de carro a caminho da festa de Natal.

Este não é um caso isolado. Pelo contrário, é mais um dos milhares de casos que ocorrem pelo país a fora, sem que os responsáveis sejam efetivamente punidos e que o Estado adote medidas como o faz o decreto assinado pelo presidente Lula e as regulamentações adicionais do Ministério da Justiça e Cidadania. O uso desmedido das forças policiais ocorre com frequência. A edição deste decreto já veio tardia, mas é uma boa notícia para as classes populares acima citadas. Este é um assunto, portanto, do maior interesse para a CUT. A violência histórica contra as classes populares precisa ser contida e este decreto é um primeiro passo.

Apoiamos integralmente a postura corajosa e ousada do Ministro da Justiça, que possibilitou um processo de discussão amplo e democrático na construção do decreto que, dentre suas diretrizes gerais estabelece que:

“um recurso de força somente poderá ser empregado quando outros recursos de menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos; o nível da força utilizado deve ser compatível com a gravidade da ameaça apresentada pela conduta das pessoas envolvidas e os objetivos legítimos da ação do profissional de segurança pública”.

Assegura ainda, em suas diretrizes que:

“a força deve ser empregada com bom senso, prudência e equilíbrio, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, com vistas a atingir um objetivo legítimo da aplicação da lei; os órgãos e os profissionais de segurança pública devem assumir a responsabilidade pelo uso inadequado da força, após a conclusão de processo de investigação, respeitado o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório; e os profissionais de segurança pública devem atuar de forma não discriminatória, sem preconceitos de raça, etnia, cor, gênero, orientação sexual, idioma, religião, nacionalidade, origem social, deficiência, situação econômica, opinião política ou de outra natureza”.

Em relação ao uso diferenciado da força, o decreto é equilibrado, objetivo e claro e busca atuar na raiz das posturas violentas que temos presenciado. O Art. 3º estabelece que a “força deverá ser utilizada de forma diferenciada, com a seleção apropriada do nível a ser empregado, em resposta a uma ameaça real ou potencial, com vistas a minimizar o uso de meios que possam causar ofensas, ferimentos ou mortes”. A diretriz não deixa espaço para dúvidas ao estabelecer que o “emprego de arma de fogo será medida de último recurso”.

Destaca ainda a necessidade da capacitação de profissionais de segurança pública sobre o uso da força, estabelecendo a obrigatoriedade e periodicidade anual da capacitação sobre uso da força; a realização da capacitação no horário de serviço; e a adoção de conteúdo que aborde procedimentos sobre o emprego adequado de diferentes tipos de armas de fogo e de instrumentos de menor potencial ofensivo.

O Decreto também estabelece as competências do Ministério da Justiça e Segurança Pública no financiamento, na formulação, monitoramento e avaliações das ações relacionadas ao uso da força, disponibilizando consultoria técnica especializada e desenvolvendo materiais de referência para subsidiar a implementação da regulamentação feita pelo decreto.

São muitos os aspectos tratados neste decreto, que é um primeiro passo rumo   a uma segurança para todos e todas, pondo um fim à violência e ao desequilibrado uso da força policial. Agir com rigor e usar a força adequada são medidas necessárias apenas quando usadas contra criminosos. Não podem se constituir jamais em cenas de guerra, que asseguram apenas audiência para os programas sensacionalistas, que têm na violência policial a principal atração de um jornalismo dominado por preconceitos e discriminações de todos os tipos contra as classes populares.

Não é o caso de analisar todas as diretrizes e regulamentações estabelecidas por este decreto. A expectativa é de que assim redigido não venha a ser questionado e impedido de ter plena vigência. A classe que vive de seu próprio trabalho, vendendo sua força de trabalho por diversas formas ou atuando por conta própria já vive uma situação marcada por incertezas. O decreto é um primeiro passo rumo a um serviço que traga segurança ao invés de estender suas ações violentas a quem deveriam proteger. Que seja aplicado em sua plenitude e que novas iniciativas nesta direção sejam adotadas.