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Artigo

As Pessoas com Deficiência e a Desproteção Social em tempos de Pandemia

Publicado: 06 Maio, 2020 - 00h00

"O momento que vivemos é um momento pleno de desafios. Mais de que nunca é preciso ter coragem, é preciso ter esperanças para enfrentar o presente. É preciso resistir e sonhar. É necessário alimentar os sonhos e concretiza-los dia-a-dia nos horizontes de novos tempos mais humanos, mais justos, mais solidários" (IAMAMOTO)

No último dia 22 de abril, a Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Sra. Damares Alves e a Secretária Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Sra. Priscila Gaspar, realizaram uma live no facebook que pode ser assistida através do link:

O objetivo da live era realizar um bate-papo sobre as ações de prevenção e enfrentamento ao novo coronavírus (Covid-19).

Ao longo de toda a live, a Ministra tratou a Secretária de maneira infantilizada, e, por consequência, todas as pessoas com deficiência deste País, de forma infantilizada. A atitude da Ministra reforçou o estigma da infantilização que nosso segmento tanto combate frente a uma sociedade que ainda nos vê como seres desprovidos de capacidade e habilidades.

Cotidianamente, somos vistos como corpos imperfeitos, improdutivos, sem valor para o capital. Nossa existência é negada e negligenciada a todo o momento pelo Poder Público, considerando as inúmeras barreiras físicas, arquitetônicas, comunicacionais, e, sobretudo, as atitudinais que nos privam de estar em condições igualitárias com as demais pessoas em nossa sociedade, tornando-nos invisíveis e restringindo nosso acesso às políticas públicas.

A postura da Ministra também evidenciou de forma significativa, através de sua fala e gestos, o capacitismo, ou seja, seu preconceito contra as pessoas com deficiência. A visão capacitista não permite que as pessoas com deficiência sejam vistas em condição de igualdade com as demais. Elas são consideradas incapazes, inferiores e inaptas para realizarem suas próprias escolhas e atividades do cotidiano, na escola, trabalho, relacionamentos afetivos, dentre outras que fazem parte da vida de qualquer pessoa.

A Ministra, se referiu à Secretária com expressiva admiração, ao enfatizar que Priscila estudou, e atualmente ocupa um cargo alto na esfera pública, o que nos faz questionar se Damares teceria os mesmos elogios e comentários, inapropriados como estes, aos demais Secretários e servidores sem deficiência de sua pasta. Ou seja, o fato de Priscila ter acessado seu direito à escolaridade, ao trabalho, não faz dela diferente e nem heroína em relação aos demais colegas profissionais, com e sem deficiência, os quais tiveram e necessitam ter seus direitos garantidos para ocuparem os espaços que desejarem na sociedade.

As duas usaram inúmeras vezes a palavra “ajuda” ao se referirem às iniciativas do Governo Federal, no que diz respeito ao enfrentamento da pandemia em relação às pessoas com deficiência. Este conceito nos leva a crer que o Governo ainda se utiliza do modelo caritativo, religioso e assistencialista, em relação ao atendimento e proteção social destinado às pessoas com deficiência.

As informações estratégicas de intervenção a serem adotadas pelo Poder Executivo Federal, apresentadas pelas representantes Governamentais, não ficaram claras. Isso poderia ter sido evitado com uma simples consulta prévia ao segmento das pessoas com deficiência sobre as necessidades e a melhor forma de abordagem.

Ficou perceptível a inexistência de articulações junto aos demais ministérios deste Governo, especialmente o Ministério da Saúde. Deveriam estar sendo adotadas medidas específicas voltadas às pessoas com deficiência, que inclusive devem ter garantido atendimento de saúde prioritário como manda a lei.

Outro aspecto relevante que não foi mencionado, diz respeito aos trabalhadores e trabalhadoras com deficiência, que necessitam ter seus direitos ao trabalho e à proteção social resguardados durante a pandemia, no contexto das inúmeras demissões que vêm ocorrendo.

Importante ressaltar ainda que não foram apresentadas ações que estão sendo realizadas para garantir o acesso à educação dos alunos com deficiência, que estão enfrentando inúmeras restrições, e sobretudo exclusão, devido à falta de acessibilidade em espaços virtuais, materiais e recursos educacionais.

Ao final a Ministra suplica às pessoas com deficiência e suas famílias, por meio de uma conotação puramente religiosa, pedidos de esperança e fé, o que nos faz refletir sobre a perspectiva do modelo médico da deficiência ainda adotado por este Governo. Neste modelo, a pessoa com deficiência é a única responsável por se adequar à sociedade. No modelo social da deficiência, ao contrário, a sociedade é que precisa estar acessível para incluir todas as pessoas com deficiência, cabendo ao Estado e à sociedade a remoção das barreiras que inviabilizam a plena inclusão.

Claramente, este Governo se exime em executar as políticas públicas que garantam nossa dignidade, nossa proteção social enquanto garantia constitucional, em conformidade com o estabelecido na Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, e na Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência), importantes marcos legais conquistados com muita luta ao longo de nossa história. Particularmente neste momento de pandemia, onde a LBI prevê em seu art.9°, a prioridade no atendimento, proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, em todas as instituições e serviços de atendimento ao público.

Mais uma vez, este Desgoverno demonstra de forma escancarada sua omissão, seu despreparo, incapacidade de ação e, sobretudo, seu amadorismo ao lidar com a preservação da vida do povo Brasileiro.

Defendemos o Direito à vida, à dignidade, e o Protagonismo ativo das Pessoas com Deficiência!