CUT defende a aprovação de projeto de lei em tramitação no Congresso que estabelece um marco nacional para regulamentar os impactos das empresas sobre os direitos humanos dos trabalhadores
Uma decisão da Justiça da Bahia colocou fim, ao menos em primeira instância, a um dos mais graves casos de contaminação ambiental do país. Depois de 32 anos de espera, a justiça condenou três empresas pelos danos causados à população de Santo Amaro, no Recôncavo Baiano, em razão da atuação da antiga fábrica de ligas de chumbo que funcionou no município entre as décadas de 1960 e 1990.
A sentença, assinada pela juíza Emília Gondim Teixeira, reconhece que o município foi transformado em um verdadeiro “repositório tóxico” após décadas de descarte inadequado de escória contendo chumbo e cádmio. Esses resíduos foram espalhados por diversas áreas da cidade, incluindo ruas, quintais e terrenos utilizados por famílias que desconheciam o risco. O impacto ambiental e humano da contaminação foi tão profundo que persiste até os dias de hoje. A informação foi divulgada pelo UOL na semana passada.
Estudos apresentados no processo indicam que aproximadamente 1.200 famílias vivem a menos de 500 metros da antiga fundição, convivendo diariamente com o histórico de poluição deixado pela operação industrial. Crianças da periferia figuram entre os grupos mais vulneráveis, dada a maior suscetibilidade aos efeitos do chumbo no organismo.
A juíza também reconheceu a ocorrência de racismo ambiental, destacando que a maioria da população atingida é composta por pessoas negras. Foram condenadas as empresas Trevisa Investimentos, Yara Brasil Fertilizantes e Plumbum Comércio, consideradas sucessoras da antiga Cobrac, responsável pela operação da fundição.
Ambientalistas e organizações de direitos humanos consideram o caso emblemático por envolver, simultaneamente, danos ambientais, violação de direitos humanos e injustiça racial.
Para a secretária nacional de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara, o longo tempo até a responsabilização demonstra a fragilidade da justiça diante de grandes corporações.
“Impressionante a morosidade da justiça em casos de graves violações de direitos humanos e ambientais. As grandes empresas, especialmente multinacionais como a norueguesa Yara Fertilizantes, cometem recorrentes violações no Brasil e se utilizam das fragilidades do sistema de justiça do Brasil”, disse a dirigente.
Indenização a moradores
A Justiça determinou indenizações que variam de R$ 100 mil a R$ 220 mil para os moradores conforme o grau de contaminação registrado. Para as famílias que utilizaram a escória para pavimentar quintais e vias próximas às residências, o valor estabelecido é de R$ 30 mil. Pessoas negras terão direito a um acréscimo de 25% sobre as indenizações. Todas as empresas recorreram da decisão.
Além da compensação financeira, a sentença prevê medidas estruturais para mitigar os danos históricos. Entre elas, a retirada completa da escória em um raio de 5 quilômetros da antiga fábrica e a criação de um fundo de R$ 5 milhões destinado a projetos sociais voltados a crianças e adolescentes de Santo Amaro.
É por estas e outras razões que a CUT defende a aprovação da Lei Marco de Direitos Humanos e Empresas (PL 572/2022) em tramitação na Câmara dos Deputados.- Jandyra UeharaO Projeto de Lei 572/2022, já em tramitação no Congresso Nacional, prevê a criação de um marco nacional para regulamentar os impactos das empresas sobre os direitos humanos de trabalhadores, povos, comunidades e territórios.
Reparação
A iniciativa busca oferecer algum tipo de reparação às novas gerações, que ainda convivem com as consequências da contaminação ambiental.
A decisão, embora histórica, ainda depende do julgamento dos recursos. Para os moradores de Santo Amaro, no entanto, representa um passo importante na luta por reconhecimento, justiça e reparação após décadas de exposição tóxica.