Escrito por: Rute Pina, Brasil de Fato | São Paulo (SP)
Ao todo, órgão regulador pediu a interdição de 56 empreendimentos; 17 não tiveram estabilidade atestada
"Temos uma região metropolitana com cerca de 3 milhões de pessoas que pode não ter acesso a água porque o Parauapebas já foi contaminado e essas estruturas que estão em risco iminentes pode contaminar Bela Sama. Onde vamos buscar água?", questiona.
A militante lembra que, desde 2014, os movimentos e atingidos questionam o modelo de auditoria. Naquele ano, a barragem Herculano Mineração — que tinha declaração de estabilidade — rompeu em Itabirito (MG) e matou três trabalhadores. Já em Mariana, a segurança da Barragem do Fundão foi atestada em julho de 2015, quatro meses antes do estouro da represa da Samarco.
“Nós não conseguimos mais acreditar nestes atestados de estabilidade porque está configurado que as empresas de mineração não vieram realmente tratando desse assunto. São meros papéis que não têm uma validade real em relação à segurança. E, por isso, é fundamental que não mais ficassem na mão das empresas mineradoras o contato com essas consultorias.”
O engenheiro Bruno Milanez, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), também questiona o modelo de fiscalização. Ele explica que as empresas são responsáveis por escolher os auditores — empresas de consultoria ou mesmo engenheiros independentes — que fazem as inspeções e os relatórios finais que atestam a estabilidade, além de recomendações com base na documentação das empresas.
“Essa situação da empresa mineradora escolher e remunerar o auditor é um conflito de interesses. A gente já escrevia isso desde [o rompimento da barragem de] Fundão”, pontua o engenheiro.
Em setembro de 2018, a Vale demitiu um auditor que se recusou a certificar a barragem que se rompeu em Brumadinho (MG) no início do ano, segundo investigação da polícia e do Ministério Público. A decisão foi tomada meses antes da tragédia que deixou mais de 217 mortes; outras 82 pessoas ainda estão desaparecidas.
“Essa facilidade que a empresa tem de trocar de auditor e o poder que ela tem de influenciar as decisões por conta do poder econômico dela gera conflitos. E essa relação das mineradoras com as empresas ainda não mudou após o crime ambiental em Brumadinho”, continua Milanez.
A mineradora substituiu o auditor pela Tüv Süd, companhia alemã de certificação. Desde o rompimento da barragem, funcionários da mineradora e da consultora tentam se isentar da responsabilidade pela tragédia. O engenheiro da empresa alemã, Makoto Namba, disse à Polícia Federal que, mesmo identificando problemas, se sentiu pressionado por um executivo da Vale para conceder o documento.
Entre as 56 barragens que perderam Declaração de Condição de Estabilidade, 17 eram da Vale. Em nota para acionistas, a Vale afirmou que a perda das DCEs não agrava seu fator de segurança, nem altera a projeção de vendas de minério de ferro.
A mineradora afirmou ainda que sua prioridade é com “a segurança de todas as suas estruturas e, consequentemente, da população e trabalhadores a jusante”. “A produção dessas localidades somente será retomada quando a segurança das estruturas estiver assegurada”, finaliza a empresa.