Escrito por: Luiz Carvalho
Em terceiro módulo de curso de formação, economista destaca necessidade de romper com atual modelo de produção
Curso de formação chegou ao terceiro módulo com cutistas de todos os estados do país (Fotos: Roberto Parizotti)
Nos anos 2000, a economia brasileira e o PIB (Produto Interno Bruto) cresceram, a inflação caiu, o emprego diminuiu, o país implementou uma política de valorização permanente do salário mínimo. Mas nenhuma dessas medidas modificou efetivamente a segregação do trabalho das mulheres.
Essa é a conclusão da professora da Unicamp, Eugenia Tranconso, que apresentou um estudo durante curso de formação para diretoras e trabalhadoras representadas pela CUT na última semana.
Segundo ela, para que a continuidade do crescimento da economia gere efeitos favoráveis ao bem-estar da população, é preciso reestruturar o mercado de trabalho a partir da redução significativa das desvantagens das mulheres, que ainda enfrentam dupla jornada e recebem menos, apesar de melhor qualificação.
“Nas áreas onde há maior concentração de mulheres e mais escolaridade, a diferença salarial é maior. No emprego formal, 25,5% das mulheres tem nível superior contra 13,3% dos homens, por exemplo. Ainda assim, o rendimento dos homens supera o das mulheres na mesma função em 14,8%”, apontou.
Há áreas em que essa diferença é brutal. No serviço administrativo, em que 60,4% são trabalhadoras, o rendimento dos homens supera o das mulheres em 30%.
A pergunta, portanto, é como mudar esse cenário. A resposta, de acordo com a economista Marilane Teixeira, passa por romper com o sistema capitalista.
“No início do século 20, a mulher lutava por direitos básicos, como o voto, conquistado no Brasil em 1932, para reduzir a jornada, regulamentar o trabalho insalubre. Nos anos 1960 e 1970, a luta era em defesa do reconhecimento à dupla discriminação de gênero, como mulher e trabalhadora, que realiza dupla jornada, para reconhecimento do trabalho doméstico não remunerado. E, nos anos 2000, apesar de avanços e de ocuparem espaços onde ainda não estavam presentes, há o entendimento de que não haverá mudanças estruturais sem romper com o modelo de produção e consumo. Porque os homens, em geral, se beneficiam da dupla jornada e dos salários inferiores que recebemos”, explica.
Para as trabalhadoras da CUT, a transformação depende de mobilização que, por sua vez, passa pelo processo de formação para a luta e defesa da igualdade. Um grande passo foi dado com a aprovação no 11º Concut (Congresso Nacional da CUT) da paridade entre homens e mulheres na composição da direção nacional e das estaduais.
O próximo passo, destaca a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Rosane Silva, é aprimorar a concepção do feminismo dentro da Central para que os espaços ocupados pelas trabalhadoras sejam sinônimo de mudanças no sindicalismo cutista.
“Nosso objetivo com o curso é formar novas lideranças feministas. Porque quando propomos a paridade não foi só para ocupar espaços de poder simbolicamente, mas para superar o machismo e, para isso, temos que ter mulheres que compreendam o significado do feminismo e porque lutamos por uma sociedade igualitária”, explicou.
Racismo – Um das palestrantes desse terceiro módulo do curso de formação para as trabalhadoras da CUT, a secretária de Combate ao Racismo da Central, Maria Júlia, ressaltou avanços da última década, como a criação de uma secretaria de Políticas Promoção para a Igualdade Racial (Seppir), a criação da Lei 10.639/03, que institui o ensino das escolas públicas e particulares da história e cultura afro-brasileira e africana, e lei de cotas nas universidades e serviços públicos.
Para a dirigente, os avanços não são benesses, mas sim o reconhecimento da dívida do Estado com os negros.
“Com o fim da escravidão, os negros não recebiam nenhum tipo de retribuição financeira pelo trabalho que realizavam e, assim, começamos a entender porque as desigualdades persistem até hoje.”
Júlia ressalta que a reflexão sobre o racismo no mês da Consciência Negra ajuda a quebrar a ideia de que a discriminação no Brasil é camuflada, conforme discute a publicação Revista CUT com Raça, que a central lançou recentemente.
“Uma das ideias que quebramos com nossas marchas é a de que a miscigenação no país foi tão grande que vivemos em harmonia. Convivemos sim, mas o preconceito, a exclusão dos negros nos melhores postos sob a alegação de boa aparência, por exemplo, continua. Somos 52% da população, mas quando vamos olhar nos espaços de poder, ou a representação é pequena ou inexiste. A gente olha as estatísticas e pesquisas e vê que mulheres negras estão na base da pirâmide. Quando se observa postos de trabalho considerados precários, as mulheres negras também estão lá e sofrem por serem mulheres e por serem negras”, defende.