Escrito por: Sérgio Cruz/Hora do Povo

Rodoanel: governo de SP permitiu vigas mais...



As vigas racharam esmagando três veículos edeixando dois homens e uma mulher feridos

Nasexta-feira, 13 de novembro, mais uma obra sob responsabilidade do governo deSão Paulo desabou - apesar de não serem muitas. Desta vez foram três das quatrovigas de sustentação do viaduto do Rodoanel sobre a Rodovia Régis Bittencourt.As vigas de 80 toneladas espatifaram-se sobre a estrada. O desabamento, na alturada cidade de Embu, na Grande São Paulo, atingiu uma carreta e dois carros quepassavam pelo local, ferindo três pessoas, uma delas em estado grave.

A obra previa a instalação de cinco vigas em cadalado do viaduto do Rodoanel. Entretanto, uma das vigas apresentou uma rachadurano transporte até o local da obra. Sem levar em conta que as outras quatropoderiam apresentar o mesmo defeito, o consórcio decidiu prosseguir nainstalação. Resultado: três vigas despencaram sobre a Régis. E não tinha sidopor falta de aviso. O Tribunal de Contas da União (TCU) informou em setembroque o consórcio constituído pela OAS, Mendes Júnior e Carioca Engenharia, com oobjetivo de baratear os custos, havia trocado as vigas, usando materialpré-moldado, de menor qualidade, fora da especificação original.

Irregularidades

A troca das vigas foi uma das 79 irregularidadesclassificadas como "graves" em relatório emitido pelo órgão. A decisão deinstalar quatro vigas suspeitas, além de criminosa, desconsiderou a norma deque a instalação só podia ser feita se fosse com todas as vigas. O projetoinicial previa fundações de concreto, conhecidas como tubulões, material maiscaro que o usado hoje pelo consórcio, na sustentação dos vãos livres. Essaprevisão inicial, inclusive, era de sete vigas de sustentação em cada vão e nãocinco. Segundo técnicos, o normal é que todas as vigas de uma mesma estruturafossem instaladas na sequência, pois elas são "amarradas" umas às outras. Alémde reduzir para cinco, o consórcio decidiu instalar apenas quatro pré-moldadas.

Para o presidente do Conselho Regional deEngenharia e Arquitetura de São Paulo (CREA-SP), José Tadeu da Silva, a reduçãodas vigas pode ser enquadrada como "negligência, imperícia ou imprudência".

Nenhuma fiscalização dessas irregularidades foirealizada pelas autoridades do governo do estado. A falta da amarração final,que fixaria as cinco vigas na estrutura, além da baixa qualidade do material,pode, na opinião de técnicos, ter sido um dos fatores que contribuíram para odesastre. Segundo o TCU, foi reduzida a quantidade de material de construçãousado na obra, mas os preços, repassados ao Estado, foram mantidos.

Não se sabe exatamente o motivo pelo qual o TCU nãorecomendou a paralisação da obra ou o bloqueio dos repasses. O órgão éconhecido por paralisar obras do PAC até para discutir o preço do saboneteusado em canteiros de obras. No caso do Rodoanel de São Paulo, financiadoparcialmente com dinheiro federal, mas administrado pelo governo Serra, nadafez. No inicio do ano, o TCU informou que foram detectados superfaturamentosque chegaram a R$ 184 milhões. As mudanças nas obras, segundo o tribunal,resultaram numa "combinação altamente danosa às finanças" públicas. Apesar detudo isso, a obra prosseguiu até o desabamento.

Como conseqüência do desabamento, ReginaldoAparecido Pereira, de 40 anos, caminhoneiro, sofreu traumatismo craniano gravee não tem previsão de alta. Uma mulher de nome Luana Augusto, de 21 anos, quedirigia um Clio vermelho, totalmente destruído, foi ferida. E o ferramenteiroCarlos Fernando Rangel, de 38 anos, fraturou o punho esquerdo e permaneceinternado num hospital da região.

Apesar do governador ter comemorado a falta devítimas fatais no desmoronamento, uma pessoa morreu e duas ficaram feridas nosúbito engarrafamento que se seguiu ao desabamento, após um Ford EcoSport pretobater violentamente contra a traseira de um caminhão próximo do local onde astrês vigas caíram sobre a Rodovia.

Desastres

Definitivamente, com este desabamento, aadministração José Serra adquiriu a sua marca. Logo no início de seu governo aobra da linha 4-Amarela do metrô de São Paulo desmoronou, abrindo uma craterade 80 metros de diâmetro por 30 metros de profundidade que engoliu quatrocaminhões, dois carros e uma van. Sete pessoas morreram soterradas e 79famílias ficaram sem suas casas. Até hoje os culpados não foram apontados. AOAS, integrante do consórcio do Rodoanel, participou também das obras da linha4, onde o contrato, conhecido como "porteira fechada", previa o repasseantecipado das verbas, sem qualquer fiscalização por parte do governo.

A outra empresa do consórcio, a Carioca Engenharia,também participou da ampliação do Expresso Tiradentes (antigo Fura-Fila) até aVila Prudente, onde, no ano passado, um viaduto em construção tombou sobre apista da Avenida do Estado. Agora veio a queda das vigas do Rodoanel. O vice deJosé Serra, Alberto Goldman, afirmou que o desastre do Rodoanel é "coisacomum". No atual governo de São Paulo, é verdade.

"Investigação"

"Acidentes em obras são comuns. Acidentes sobrerodovias não são comuns", afirmou o vice-governador. Segundo ele, a queda daviga "não é um fato tão diferente". "A diferença é que essa viga foi colocadaem cima de uma estrada em movimento", prosseguiu. "Se ela tivesse ocorrido emoutras áreas do Rodoanel - e pode até ter ocorrido -, ninguém saberia. Nem eusei", completou o sagaz vice-governador.

O secretário de transportes de Serra, Mauro Arce,foi ainda mais fundo na análise que fez sobre o desabamento. "Ainda não sabemosse as vigas caíram porque ruíram ou se ruíram depois que caíram", disse. Já odiretor do Dersa (Desenvolvimento Rodoviário SA), órgão teoricamenteresponsável pela fiscalização, Paulo Vieira de Souza, afirmou que acha que "houveerro de execução do projeto", mas não tem certeza.

De posse das evidências de uma atuação criminosa edo total descaso na fiscalização das obras, Serra tentou mais um abafa,enviando as investigações para o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas),cuja direção é toda ela nomeada por ele. Coincidentemente, o IPT foi o órgãoque fez de tudo para livrá-lo de qualquer responsabilidade na cratera da linha4 do Metrô.