Escrito por: Leonardo Wexell Severo, de São Lourenço do Oeste
Presente ao IV Congresso da Agricultura Familiar da Região Sul, líder cutista reforça mobilização da Fetraf e convoca para o encontro do Macrossetor Rural
Quintino Severo, secretário de Administração e Finanças da CUT, saúda os agricultores familiares
Na avaliação do dirigente cutista, com a crescente estrangeirização do campo e a redução dos alimentos a simples commodities, “o Brasil corre o risco de ver as exportações das multinacionais crescerem, com o povo passando fome”.
“A lógica de que o agronegócio é a saída para ampliar a exportação e alavancar a balança comercial, adotada como política pelo governo, acaba fomentando um modelo individualista e concentrador de terra e de renda que vai contra o interesse coletivo”, ressaltou Quintino, defendendo que é preciso fortalecer e ampliar as políticas públicas para a agricultura familiar, a principal responsável pelo abastecimento do mercado interno. “Como sempre, a CUT está ao lado de vocês na disputa por outras políticas públicas, que devem ir muito além do crédito e da assistência técnica”, disse.
Para o líder cutista, é preciso debater o próprio conceito de agricultura familiar, com o desafio de que ela seja o todo, uma cadeia: produção, industrialização e comercialização, “a fim de que o agricultor não tenha que entregar seu produto, sem valor agregado, ao mercado capitalista”.
A realização do Encontro do Macrossetor Rural da CUT no mês de maio, ressaltou Quintino, será um momento chave para aprofundar o debate sobre a organização sindical dos cutistas no campo e definir os rumos da nova organização, pois “a estrutura confederativa oficial está falida”. Saudando a determinação e a ousadia da Fetraf-Sul, o dirigente manifestou “grande afinidade” com os objetivos e compromissos da entidade.
Presidente da Fetraf-Brasil e membro da executiva nacional da CUT, Elisângela Araújo reforçou o alerta de Quintino sobre o avanço da “estrangeirização da terra” e cobrou do governo federal ações que, em vez de atenderem a senadora Kátia Abreu e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), “sinalizem um efetivo compromisso com a agricultura familiar, para que as famílias que continuam resistindo na sua terra não virem presa fácil do grande capital”. “Nosso sindicalismo cidadão procura incidir sobre o projeto de sociedade, sobre o futuro que queremos. Não queremos o monocultivo, um campo de agrotóxicos e transgênicos que multiplicam o câncer, comprometendo a biodiversidade e a qualidade de vida”, assinalou.
PARLAMENTARES COMPROMETIDOS
Ex-coordenadores da Fetraf-Sul e atualmente deputados estaduais, Dirceu Dresch (PT-SC) e Altemir Tortelli (PT-RS) reiteraram a premência do debate sobre a estrutura sindical, uma vez que, na sua opinião, a Central tem adiado uma posição sobre a atuação cutista no campo. Para os parlamentares, há necessidade de construir novas formas de organização, “mais coletivas, amplas e organizadas”, em contraposição à burocrática estrutura confederativa oficial.
“Temos defendido e praticado um sindicalismo solidário, com associativismo e cooperativismo, com organização de acesso ao crédito e à habitação, que vem lutando contra os impactos de um modelo que impõe a lógica da meia dúzia de grupos que dominam o mercado de alimentos no mundo”, declarou Dirceu Dresch. O parlamentar catarinense defendeu a necessidade de um “projeto nacional de desenvolvimento” que se contraponha aos interesses das grandes corporações multinacionais, “dos seus agrotóxicos e sementes transgênicas, que tiram qualquer possibilidade de autonomia com tecnologias adaptadas à sua estratégia de domínio”. Para a efetivação deste projeto de libertação, enfatizou, é essencial o aprimoramento do ensino, da ciência e da tecnologia nacional. A existência de universidades financiadas pela Monsanto, como temos hoje, condenou, apenas reproduz um “modelão” que busca perpetuar a irracionalidade de um sistema que nada mais tem a oferecer à Humanidade.
Fazendo uma reflexão a partir do agravamento da crise em que se veem mergulhados os países capitalistas centrais, o deputado Altemir Tortelli defendeu que é o momento de radicalizar na defesa de políticas públicas que priorizem o mercado interno com ênfase na agricultura familiar. “A crise econômica se aprofunda, fere o coração do sistema capitalista, afeta seus pilares. A Europa se desmancha em desemprego e a pobreza se espalha pelos Estados Unidos. Há uma crise de alimentos que afeta a ¼ da população do planeta, a crise de abastecimento de água atinge a dois bilhões de seres humanos, ao que se somam a crise ambiental e energética”, assinalou.
De acordo com o deputado gaúcho, se o governo federal pode abrir os cofres do BNDES para financiar a criação de multinacionais brasileiras – sem falar nas estrangeiras - reúne todas as condições para “efetivar empresas públicas estatais e cooperativas”. O que é inadmissível, denunciou, ”é termos uma empresa como a Embrapa servindo de instrumento de poder e controle do agronegócio sobre o campo brasileiro ou vermos políticas públicas como o Pronaf mais alimentos se converterem em Pronaf indústria de trator para beneficiar empresas multinacionais”. “Quantos bilhões movimenta o Bolsa Família? Não seria importante que parte do dinheiro utilizado para comprar comida das diferentes marcas do agronegócio e das multinacionais fosse usado para comprar diretamente da agricultura familiar? Este é o embate que está colocado”, assinalou Tortelli, defendendo, “uma ação institucional combinada com a luta social para tensionar o centro do governo”.
DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO
Assinalando a relevância da contribuição dada por Quintino Severo, Dirceu Dresch e Altemir Tortelli, o coordenador da Fetraf-Sul, Celso Ludwig, frisou que, em sintonia com essas lideranças, a entidade existe “para fazer luta política de classe”, aumentando o nível de organização e consciência dos agricultores e agricultoras familiares. Celso citou reportagens que foram ao ar recentemente no Fantástico, da Rede Globo - retribuídas no dia seguinte em forma de inserções publicitárias pelo agronegócio - para defender a inadiável democratização dos meios de comunicação, cada vez mais caixa de ressonância dos interesses do grande capital.
É com base na manipulação da opinião pública, esclareceu o coordenador da Fetraf-Sul, que muitos dirigentes e a própria luta social estão sendo criminalizados, enquanto grande parte da população continua sendo desinformada a respeito do veneno colocado sobre a sua mesa pelo agronegócio e pelas multinacionais.
O Congresso prossegue nesta quinta-feira, quando serão definidos os próximos passos da organização da Fetraf-Sul e aprovadas as suas bandeiras de luta para o período.