Escrito por: Rosely Rocha

Proposta patronal vai fazer aposentadoria virar esmola, diz secretário da CUT

Para ajustar as contas públicas entidades patronais querem desvincular o salário mínimo da Previdência Social. Economista da Unicamp diz que proposta de empresários é para terem mão de obra barata

Henry Milleo / Agência Brasil - Arquivo

A elite econômica do país volta a pressionar pelo empobrecimento da população para evitar que os ricos e os super-ricos paguem mais impostos , e que seja feito o ajuste das contas públicas a partir da premissa de quem ganha mais paga mais e quem ganha menos paga menos.

Desta vez, entidades patronais vêm defendendo a desvinculação do salário mínimo das aposentadorias e de benefícios sociais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), o abono salarial, o seguro desemprego, e que os novos beneficiários do BPC passem a receber valor equivalente ao pago pelo Bolsa Família.

Para o secretário de Pessoas Aposentadas, Pensionistas e Idosas da CUT Nacional, Ari Aloraldo do Nascimento essa proposta fará com que os valores pagos a aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) se transformem em esmola.

É importante que as pessoas entendam essa desvinculação da previdência. Sem ganho real a aposentadoria vai virar uma esmola, vai deteriorar cada vez mais o poder de compra- Ari Aloraldo do Nascimento

Hoje quem ganha um salário mínimo de aposentadoria tem direito à correção do valor pela inflação mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de acordo com a Política de Valorização do Salário Mínimo, e desvincular esse reajuste da previdência social, reduzirá o que é pago.

O impacto dessa redução nas aposentadorias será imenso no bolso de milhões de brasileiros. Esse direito a quem trabalhou por décadas é responsável pelo sustento de 5 milhões de pessoas, sendo que 34% dos domicílios brasileiros necessitam de 70% da renda dos idosos para pagar as contas do mês.

De olho no Congresso

O secretário da CUT alerta que o momento é difícil porque temos um Congresso formado em sua maioria pela direita e extrema direita, que não está preocupado com os assalariados, os aposentados e quem depende de política pública. A única preocupação deles é com o 1% mais rico da população.

“A CUT e as demais centrais são totalmente contrárias à essa proposta. Vamos fazer um diálogo, mas sem deixar de fazer o enfrentamento e articular uma reação no Congresso. Vamos expor de forma objetiva para os aposentados quem são os deputados e senadores que se voltam contra os mais pobres e não querem que os ricos paguem impostos. Queremos deixar de forma objetiva para que as pessoas possam identificar de que lado está cada parlamentar”, afirma Ari Aloraldo.

A economista e pesquisadora da Unicamp, Marilane Teixeira conta que a proposta de reduzir benefícios e salários sempre volta à tona porque não interessa aos empresários que os mais pobres possam escolher seus empregos.

Os empresários querem mão de obra barata e a desculpa deles de que não conseguem contratar é a de que há muitos benefícios sociais. Eles nunca reconhecerão que pagam pouco e querem explorar os mais pobres- Marilane Teixeira

A economista cita como exemplo o caso recente do “rei do ovo” que afirmou que o Bolsa Família impediu que trabalhadores procurassem emprego. Mas dados do governo federal mostram que 1,2 milhão de beneficiários do programa entraram no mercado de trabalho em 2024.

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O que o empresário Ricardo Faria, o "rei do ovo", no entanto, não disse na sua entrevista ao jornal Folha de São Paulo, é que ele recorreu a financiamento público para construir seu império e se tornar um dos homens mais ricos do país. Entre 2007 e 2024, o bilionário conseguiu pelo menos 71 empréstimos, que totalizam R$ 132 milhões em valores atualizados, junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de acordo com levantamento feito pelo colunista Tácio Lorran do site Metrópoles.

“Esses empresários não querem pagar imposto de renda, nem melhorar os salários. Então, é muito comum esse tipo de proposta para forçar os pobres a aceitarem qualquer tipo de trabalho”, reforça Marilane.

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A proposta das entidades patronais

As propostas assinadas pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras (Fin, ex-CNF), pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) e pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) foram entregues recentemente ao presidente Lula, que por diversas vezes já rechaçou que não tomará tal medida, mas a população deve ficar alerta porque o Congresso Nacional, composto em sua maioria por empresários, opositores ao governo federal, vem “segurando” a votação das propostas de taxar os mais ricos e isentar quem tem renda de até R$ 5 mil de pagar imposto de renda. Para parte do Congresso é mais fácil tirar dos pobres e dos aposentados, aumentando a desigualdade social. Mesmo que Lula vete, deputados e senadores podem derrubar o veto e a proposta se tornar lei.

Sobre as aposentadorias

Dados do governo federal do ano passado mostram que o sistema previdenciário brasileiro é o maior de todos os programas sociais do país e injeta mais de R$ 70 bilhões na nossa economia. Atualmente, existem 23.034.648 trabalhadores aposentados e aposentadas no Brasil. Desse total, 11.238.991 são homens e 11.795.657 são mulheres. Quase 70% dos municípios brasileiros dependem dos benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Segundo o último Boletim da Previdência Social de 2024, o valor médio do benefício é de R$ 1.847,13. Sendo que em áreas urbanas o montante médio é de R$ 1.930,15 e, nas rurais, R$ 1.413,68.

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Contas públicas

O governo recolhe impostos, taxas e contribuições para pagar a prestação de serviços à população. Ele também financia suas atividades levantando dinheiro com a venda de títulos públicos. As contabilidades dessas operações são feitas mensalmente e totalizadas em dois indicadores: o “resultado primário” e o “resultado nominal.”

O resultado primário indica o saldo entre os valores arrecadados e os valores gastos. Quando há mais arrecadação do que gasto, há superávit primário. Quando há mais gasto do que arrecadação, há déficit primário.

O termo “primário” significa que o resultado não contabiliza outros valores, por exemplo aqueles que o governo desembolsou pagando juros ou resgates de títulos emitidos da dívida pública federal, e nem aquilo que arrecadou com a venda de novos títulos no mercado financeiro, dentro e fora do Brasil, junto a bancos, fundos de pensão, empresas e até pessoas físicas.

O indicador que faz essa contabilidade é o “resultado nominal”, que em síntese é a diferença, em determinado período, entre as receitas totais (arrecadação mais aplicações financeiras) e as despesas totais (gastos mais despesas com juros). Os resultados nominais acumulados são totalizados no estoque da dívida pública.

No acumulado deste ano, o setor público consolidado registra superávit primário de R$ 102,860 bilhões. Em 12 meses - encerrados em abril - as contas acumulam um pequeno resultado negativo de R$ 6,012 bilhões, o que corresponde a 0,05% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma de todos os bens e serviços produzidos no país).

Em 2024, as contas públicas fecharam o ano com déficit primário de R$ 47,553 bilhões, 0,4% do PIB. (Informações da Agência Brasil )