Diferente da proposta original, texto aprovado na Câmara dificulta ações da Polícia Federal e estimula blindagem ao crime organizado
A Câmara dos Deputados aprovou o texto-base do projeto de lei de combate ao crime organizado (PL 5582/2025). A iniciativa partiu do governo Lula, mas o texto aprovado não foi o encaminhado pelo Executivo.
O relator Guilherme Derrite (PP-SP) alterou profundamente a proposta, retirando pontos centrais que garantiam investigação integrada e sufocamento financeiro das facções criminosas.
O projeto original previa cooperação entre Polícia Federal, Receita Federal, Banco Central e Coaf(Conselho de Controle de Atividades Financeiras), fortalecendo a capacidade de rastrear e bloquear recursos das organizações criminosas.
No entanto, essa ‘espinha dorsal’ foi desmontada no projeto substitutivo, que, embora endureça penas, reduz instrumentos de investigação e cria brechas legais que favorecem a impunidade.
Deputados da base governista denunciaram que o substitutivo dificulta o trabalho da PF e enfraquece estratégias de estrangulamento financeiro das facções. Em reportagem da Agência Câmara, o líder do PT, Lindbergh Farias, afirmou que “faltou diálogo e vontade de negociar”.
“Faltou diálogo, vontade de sentar na mesa de negociação. Continuam tirando dinheiro da Polícia Federal e atrapalhando a investigação pela Receita”- Dep. Lindbergh Farias
Segundo a análise dos parlamentares progressistas, a versão aprovada pode dificultar o trabalho da Polícia Federal para investigar e combater o crime organizado.
Para Glauber Braga (PSOL-RJ), a versão de Derrite também reduzirá os recursos da PF.
“o relatório é um incentivo à blindagem de organizações criminosas de colarinho branco- Dep. Glauber BragaJá a deputada Maria do Rosário (PT-RS) afirmou que a versão atual do texto descaracteriza a proposta de enfrentar o crime organizado e as facções criminosas com segurança, inteligência e base em evidências.
“O projeto de lei [em sua versão original elaborada pelo governo] integra totalmente a PF, a Receita, o Banco Central e o Coaf para sufocar a lavagem de dinheiro. Mas no relatório a cooperação passa a não ser integrada, flexibiliza a favor do crime”- Dep. Maria do RosárioOs principais pontos da proposta aprovada pela Câmara
O que ficou de fora
Tentativa de equiparar facções a terrorismo: A oposição tentou inserir destaque para classificar facções como grupos terroristas. O presidente da Câmara, Hugo Motta, impediu a votação. Afirmou que a matéria era "estranha ao projeto" e se alinhou à posição do governo e de especialistas. O temor era de que a medida desse margem para eventuais tentativas de interferência internacional.
Riscos à população e ao país: O texto aprovado prevê que líderes de facções sejam mantidos em presídios federais de segurança máxima. Sem recursos adequados e com as limitações impostas pelo substitutivo, há risco de desestabilização dessas unidades, fundamentais para isolar chefes do crime organizado.
Direitos Sociais: Além de enfraquecer a PF, o projeto retira direitos sociais. Dependentes de presos condenados não terão acesso ao auxílio-reclusão, medida que penaliza famílias trabalhadoras sem enfrentar as causas estruturais da violência e da desigualdade.
Clique aqui para ver o texto do projeto original
Pressão no Senado
Agora, o projeto segue para o Senado. É fundamental que a sociedade pressione os senadores para que recusem o texto aprovado na Câmara. O Brasil precisa de um marco legal que fortaleça a Polícia Federal, garanta investigação integrada e ataque o financiamento das facções. Sem essa mobilização, há o risco de que seja consolidado um projeto que endurece penas apenas no papel e que fragiliza a inteligência e a capacidade de investigação, abrindo espaço para a impunidade, além de colocar em risco a democracia e a segurança coletiva.
Entenda a ligação Guilherme Derrite, Tarcísio de Freitas e PEC Antifacção
A escolha de Derrite como relator não foi técnica, mas política. Licenciado do cargo de secretário de Segurança Pública de São Paulo, no governo Tarcísio de Freitas, sua indicação contaminou o debate com interesses partidários e marcou um gesto claro de alinhamento ao bolsonarismo. A intenção foi usar Derrite como símbolo de uma agenda de linha-dura, disputando protagonismo nacional na segurança pública e tentando enfraquecer o papel do governo Lula.
Quem é Guilherme Derrite
Ex-capitão da Polícia Militar e aliado de Jair Bolsonaro, Derrite construiu sua carreira defendendo políticas de confronto. Atuou na Rota, unidade de elite da PM paulista marcada por operações violentas, e como secretário de Segurança Pública foi criticado por brutalidade policial. As operações Escudo e Verão na Baixada Santista, entre 2023 e 2024, deixaram 84 mortos e foram denunciadas por abuso de força contra jovens negros e pobres.
Com informações da Agência Câmara