Escrito por: Rosely Rocha
Interesses políticos da oposição ao governo atrasam votação da isenção do Imposto de Renda em até R$ 5 mil. Parlamentares querem a anistia para Jair Bolsonaro e golpistas, prejudicando 20 milhões de brasileiros
O projeto de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, beneficiando numa escala quem tem renda de até R$ 7.350, vem sendo motivo de disputa política no Congresso Nacional em detrimento de 20 milhões de brasileiros e brasileiras que podem ter até R$ 4 mil a mais no bolso por ano, segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estática e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Partidos de direita e oposição ao presidente Lula, especialmente o PL de Jair Bolsonaro, presidido por Valdemar da Costa Neto, vêm boicotando a pauta econômica do governo para forçar a anistia ao ex-presidente, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 27 anos e três meses de prisão, aos seus aliados que tramaram o golpe de Estado e aos presos e processados pelos atos de 8 de janeiro de 2023, dia em que quebraram a Praça dos Três Poderes, em Brasília.
O deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do projeto de anistia, que vem articulando com Michel Temer (MDB-SP) e Aécio Neves (PSDB-MG) uma forma de diminuir a pena dos golpistas e até mesmo promover a anistia, disse nessa quarta-feira (24), que a votação do tema pode impactar diretamente o andamento da proposta de isenção do Imposto de Renda. O que a bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) discordou totalmente após uma reunião com o deputado.
Numa coletiva de imprensa Paulinho da Força afirmou que “se não votar isso, não vai votar IR”.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), no entanto, marcou a votação do projeto de isenção para a próxima quarta-feira (1º), mas diante da pressão da oposição não se tem 100% de garantia da sua aprovação ou até mesmo da sua votação. Para alguns parlamentares de direita, a isenção do imposto de renda pode beneficiar Lula nas eleições presidenciais do ano que vem.
Senado e Câmara caminham em lados opostos sobre isenção do IR
O projeto de isenção do IR que tramita na Câmara foi enviado em março pelo presidente Lula e prevê a taxação dos chamados "super-ricos" de forma progressiva, chegando a 10% para quem ganha mais de R$ 1,2 milhão por ano para que haja uma compensação à perda da arrecadação com a isenção, calculada em torno de R$ 25 bilhões. A alíquota não valerá para quem já paga 27,5% de IR.
O relator do projeto, o deputado Arthur Lira (PL-A) apresentou seu relatório em que praticamente seguiu a proposta do governo. No entanto, o próprio Lira afirmou que será preciso “muitos debates” antes de ir à votação.
Já a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou, na quarta-feira um outro projeto de isenção do imposto de renda até R$ 5 mil, de autoria do senador Eduardo Braga (MDB-AM), que tramitava por lá. O relator do projeto na Casa, Renan Calheiros (MDB-AL) disse que a decisão foi uma resposta à demora da Câmara dos Deputados para votar a proposta do governo federal.
O analista do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), André Santos explica a tramitação e as disputas políticas entre Calheiros e Lira que levaram a CAE do Senado a se antecipar à Câmara. Ambos foram eleitos pelo estado de Alagoas e são inimigos políticos.
“Existe uma rivalidade entre os dois no estado e a relatoria da isenção do imposto de renda caiu para os dois [um na Câmara e outro no Senado] e um quer se sobressair em cima do outro. Agora com o comportamento um pouco mais arredio da Câmara em votar pautas que na leitura da oposição podem beneficiar o governo, não importando se beneficia a sociedade, Renan se antecipou, tendo uma dimensão maior dentro da mídia por ter aprovado a isenção do imposto de renda”, diz André Santos.
Aprovação pelo Senado não garante a isenção do IR
Pelo regulamento do Congresso Nacional o projeto aprovado pela CAE vai diretamente para a Câmara Federal sem precisar passar por votação no plenário do Senado, a não ser que haja alguma contestação em cinco dias úteis.
O analista do Diap explica que os textos do governo federal e do senador Eduardo Braga são muito semelhantes, mas para o do Senado passar a valer precisa passar pelo relator da Câmara, que é Arthur Lira.
“São várias possibilidades. Lira pode rejeitar ou pegar o projeto do Senado, apensar ao de Lula; aprovar só o projeto do governo ou ainda deixar o projeto do Senado tramitando por lá, sem nenhuma alteração, nem nada, ou ainda pegar aquele projeto do governo e encaminhar para o Senado”, diz André Santos.
“Se o Senado fizer alguma alteração ao projeto do governo, ele volta para a Câmara dar a palavra final. Se por um acaso Lira aprovar o projeto do Senado, com alterações, ele volta para o Senado dar a palavra final. Lira também pode aprovar o projeto do Senado do jeito que está para ir à sanção, ou ele rejeita e manda o projeto do Poder Executivo para o Senado avaliar as alterações que ele fez”.
“Regimentalmente são filigramas do processo, mas o pano de fundo é essa disputa política regional que está em jogo”, conclui o analista do Diap.