Escrito por: MST - Rafael Tatemoto

MST promove unidade em defesa da reforma agrária no Ceará

Encontro divulgou Carta do Ceará, com definição de ações em defesa da reforma agrária

MST
Encontro no Ceará contou com diversas organizações como a CUT


O MST realizou um ato político em defesa da Reforma Agrária, dos Direitos Sociais e da Democracia que reuniu diversas organizações, representantes um amplo espectro das forças progressistas no país. Durante as falas, foi ressaltada a necessidade de mobilização da classe trabalhadora e de articulação entre suas entidades representativas durante 2017. 

O  evento ocorreu na noite desta quarta-feira (25), terceiro dia do Encontro da Coordenação Nacional do MST, que se realiza em Fortaleza (CE) e vai até sexta-feira (27). Cerca de 400 delegados e delegadas, vindos de todas as regiões do país, participam das atividades, focadas no debate da atual conjuntura política no Brasil.

Durante o ato, estiveram representantes de diversos partidos políticos, entidades estudantis, organizações de juventude e de mulheres, centrais sindicais e movimentos populares.

Resistência

Entre os participantes do ato, diversas falas ressaltaram o papel que os sem terra devem assumir no contexto político após o golpe de 2016. Adenaide Gonçalves,  professora da Universidade Federal do Ceará, primeira oradora da noite, relacionou o MST ao histórico de lutas do campesinato cearense desde a época colonial até a Ditadura Militar: “O MST é o filho direto de todas essas lutas, dizendo aos trabalhadores urbanos: ‘Vocês têm a greve, nós temos a ocupação’. É este movimento que escreve a história social da teimosia”. 

Janeslei Albuquerque, secretária nacional de Mobilização e Relação com Movimentos Sociais da CUT, resumiu  o as condições do país inauguradas em 2016. “É um golpe contra o processo civilizatório, contra as conquistas da humanidade. Estão querendo matar a própria ideia de ter direitos.Esse é o grande desafio que se coloca: a unidade. O que está em jogo é a própria existência do Brasil enquanto nação”, afirmou. 

A gravidade da situação política no país, que se concretiza em ataques a conquistas e direitos históricos dos trabalhadores foi mencionada em todas intervenções. 

“O momento em que vivemos é de um golpe branco. A luta, agora, é muito maior, mas quero dizer a vocês: quem com ferro fere, com ferro será ferido. Essa gente não sabe o que os espera. A liberdade e a igualdade serão sempre a nossa voz”, ressaltou Carlos Luppi, presidente nacional do PDT. 

Foram também mencionados os efeitos da ruptura da democracia sobre os camponeses. O senador José Pimentel (PT-CE) lembrou que “a trabalhadora rural terá que trabalhar dez anos a mais”, em referência à reforma da previdência, que pretende estabelecer uma idade mínima geral para aposentadoria, equiparando trabalhadores urbanos e rurais. 

Luta Social

Na avaliação de outros congressistas, o golpe demonstrou a limitação da atuação institucional e  reforçou a ideia de que projetos de transformação do Brasil dependem da luta social. A também senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) lembrou a perseguição e prisão de militantes do MST na região oeste Paraná e disse que “esse ato marca o início de nossas lutas de resistência em 2017. A gente precisa lutar muito contra os retrocessos, neste ano. Nós do Congresso precisamos nos apoiar nos movimentos sociais. Só com a população podemos reverter os efeitos do golpe”.

O papel da luta fora das instituições foi ressaltado por Luciele Silva, secretária de Movimentos Sociais do PSOL: “É muito importante um encontro como este no início deste ano. O caminho não será fácil. Nós entendemos que a luta se dará na rua, onde iremos afirmar que a democracia é essencial”. 

Neste contexto, o papel do MST na rearticulação das forças populares foi ressaltado. “O golpe apenas começou com a saída de Dilma. Ele continua na perseguição contra Lula. Este é um golpe de classe. Eles nunca tiveram compromisso com a democracia. Mas não está fácil para eles. A crise se aprofunda cada vez mais. Companheiros do MST, para além da reforma agrária, vocês serão decisivos em 2017. Com sua autoridade moral, vocês ajudam a unificar a resistência”, disse Lindberg Farias (PT-RJ).

Moara Saboia, vice-presidenta da UNE, apontou a influência das formas de luta do MST sobre a juventude: “Talvez o maior fenômeno de resistência [ao golpe] tenha sido quando os estudantes ocuparam as escolas, adotando um método utilizado pelo MST. É com muita unidade que devemos caminhar no próximo período. É na rua que podemos reverter o atual cenário, e não há nenhum movimento com maior capacidade de enraizamento do que os sem terra”.

Representando o MST no ato, João Pedro Stedile – integrante da direção nacional do movimento – delineou as linhas gerais da atuação política da organização em 2017. Agradecendo a presença dos representantes de todas organizações, disse: “Nós estamos aqui em Fortaleza e aproveitamos o ensejo de nosso encontro, com a presença de 400 delegados, para fazer um ato com as forças democráticas”.

“Nosso foco principal será derrotar o governo ilegítimo de Temer. Todos sabemos que a forma de barrar esse processo é organizar o povo e fazer luta de massa. Esperamos que em 2017 haja grandes mobilizações. O MST, com a Frente Brasil Popular, realizará uma grande marcha a Brasília exigindo [eleições] diretas já”, finalizou. 

Além das entidades mencionadas, estiveram presentes no ato político integrantes do PCB,  PC do B, CTB, MTST, Marcha Mundial das Mulheres, MAB, MPA, Levante Popular da Juventude e Consulta Popular, bem como deputados federais e estaduais, vereadores e representantes dos governos do Ceará, Bahia e da prefeitura de Fortaleza. 

O encontro apontou ainda a construção da Carta de Fortaleza, um documento em que as organizações se comprometem com a luta pela retomada da democracia.

Leia abaixo:

CARTA DE FORTALEZA

Inspirados pelas lutas camponesas cearenses, nós, coordenadoras e coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra nos reunimos em Fortaleza reivindicando a memória e o exemplo de Fidel Castro, do centenário da Revolução Russa e do cinquentenário do martírio de Che Guevara, para estudar a conjuntura política e agrária de nosso país e projetar os desafios e tarefas para o próximo período.

Há uma crise estrutural do capitalismo, acentuada desde 2008, expressa nas crises econômica, política, social e ambiental, representada pelas propostas autoritárias e fascistas, que ameaçam os direitos humanos, trabalhistas e os bens da natureza em todo mundo. Neste contexto, para que o Capital continue se apropriando dos recursos econômicos da sociedade, é necessária a eliminação dos direitos históricos da classe trabalhadora para que estes recursos estejam disponíveis unicamente para o mercado financeiro. O golpe e os atos institucionais do governo ilegítimo no Brasil, como a reforma da previdência, trabalhista, a PEC55 e a entrega do Pré-Sal são exemplares deste movimento. Diante deste cenário:

1.            Reafirmamos a necessidade de reformas estruturais e de uma Reforma Agrária Popular, que garanta a soberania alimentar, a soberania nacional contra a venda das terras para o capital estrangeiro e a defesa dos bens da natureza (a água, em especial o aquífero Guarani, a terra, os minérios, o petróleo e a biodiversidade). Somos contrários e combateremos a Medida Provisória 759 do retrocesso da Reforma Agrária, que privatiza as terras destinadas à reforma agrária, transformando-as em mercadoria, legaliza os grileiros de terras públicas e exclui os as trabalhadoras e trabalhadores acampados do processo de assentamentos.

2.            Lutaremos contra a privatização das terras, disfarçada de titulação, e que pretende livrar-se dos assentados como mecanismo de exclusão das políticas de reforma agrária. Exigimos o registro dos lotes e dos assentamentos na forma de Concessão de Direito Real de Uso da Terra (CDRU) e o impedimento da venda de terras dos assentamentos.

3.            Nos comprometemos a lutar com o conjunto dos trabalhadores e trabalhadoras contra a reforma da previdência, a reforma trabalhista e outras medidas que retirem os direitos historicamente conquistados. Nos comprometemos com a construção da Frente Brasil Popular e de seu enraizamento nos municípios.

4.            Somos solidários e solidárias a todas as formas de lutas e resistência contra o Golpe e apoiaremos todos os setores de nosso povo que tem se mobilizado em luta, desde os povos indígenas e quilombolas aos estudantes em escolas ocupadas, na defesa da educação pública. Assim, nos somaremos à jornada de lutas de 8 a 15 de março convocada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE).

5.            Denunciamos a criminalização da luta social, com a utilização de entulhos jurídicos que perseguem e condenam a luta social, sem provas e a serviço dos interesses do capital, fruto da soberba, arrogância e autoritarismo de um Poder Judiciário carregado de privilégios, mas sem nenhum compromisso social. Exigimos a liberdade de todos os trabalhadores presos e perseguidos.

6.            Convocamos todas as mulheres, do campo e urbanas, para uma grande jornada de lutas no 8 de Março. As trabalhadoras são as mais atingidas pela reforma da previdência, aprofundando as desigualdades de gênero numa sociedade machista e patriarcal.

7.            Combateremos a venda de terras para o capital estrangeiro, o retrocesso da reforma agrária e o modelo do agronegócio através de uma jornada de lutas e ocupações no mês de abril. Propomos ainda a realização de uma grande Marcha Nacional à Brasília, no segundo semestre, para denunciar as medidas do governo golpista.

8.            Defendemos a convocação de eleições gerais para o Congresso e para a Presidência da República, para que seja devolvido ao povo o direito de escolher seus representantes.

9.            Nos somaremos a Frente Brasil Popular e outras organizações de trabalhadores e trabalhadoras para construir um Programa Emergencial que combata o desemprego, a desigualdade de renda e a perda de direitos. Convocamos os trabalhadores e trabalhadoras para que no próximo período possamos construir grandes mobilizações da classe em torno do direito a Terra, a Moradia e ao Trabalho.

10.          Afirmamos nosso compromisso de solidariedade com a luta de todos os povos do mundo, frente à ofensiva do capital, o autoritarismo dos governos, a prepotência do império estadunidense, as guerras insanas, na defesa dos direitos de todos os povos por justiça e igualdade.

Nos comprometemos como militantes, homens, mulheres e jovens a assumir essas tarefas em defesa do povo brasileiro .

Fortaleza, 27 de Janeiro de 2017

Lutar! Construir Reforma Agrária Popular!