Escrito por: André Accarini

Luta da CUT, Câmara oficializa Frente em Defesa dos Trabalhadores Informais

Frente proposta pela CUT e outras entidades teve seu registro oficial assinado nesta terça (9) pelo presidente da casa Hugo Mota e atuará em defesa de políticas públicas para 43% da força de trabalho no país

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Na tarde desta terça-feira (9), a CUT e representantes de entidades que defendem os direitos de trabalhadores e trabalhadoras informais (veja abaixo) participaram de uma reunião na Câmara dos Deputados que oficializou a criação da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Trabalhadoras e dos Trabalhadores Informais. O requerimento nº 2208/2024, apresentado pelo deputado Federal Vicentinho (PT), que  oficializa o registro da frente, foi assinado pelo presidente da casa, deputado Hugo Mota (Republicanos-PB).

A conquista simboliza um passo importante para que milhões de brasileiros e brasileiras que vivem sem garantias trabalhistas passem a ter suas reivindicações reconhecidas no espaço institucional. Estima-se que mais de 43% da força de trabalho no país esteja na informalidade -  realidade que expõe trabalhadores a jornadas exaustivas, ausência de proteção social, insegurança em relação à saúde e falta de acesso a direitos básicos.

A Central foi representada na reunião pelo presidente da CUT-DF, Rodrigo Rodrigues. Para ele, o reconhecimento da frente ocorre em um momento ímpar no parlamento, onde é árdua a luta pela aprovação de pautas voltadas aos trabalhadores, como a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ mil por mês, em um Congresso Nacional.

“Em um Congresso onde parcela dos deputados se preocupa apenas com a anistia àqueles que tentaram dar um golpe de Estado no Brasil, o reconhecimento da Frente significa um avanço para as nossas pautas. Estamos falando de um trabalho, que passará a ser feito pela Frente Parlamentar, que resultará em projetos que beneficiarão diretamente trabalhadores que hoje não têm quase nenhuma ou nenhuma proteção social”, disso o dirigente.

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Articulação da frente

A criação da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Trabalhadoras e Trabalhadores Informais é fruto direto da luta da CUT e de organizações que representam os segmentos mais vulneráveis do mundo do trabalho. O reconhecimento oficial  vem após mais de um ano de articulação política e mobilização.

A mobilização começou em 2022, quando a CUT, sindicatos e organizações de trabalhadores domésticos, ambulantes, camelôs e trabalhadores e trabalhadoras da economia solidária se uniram para dar forma a uma proposta que visava criar um espaço permanente de debate no Congresso Nacional. A partir dessa articulação, o deputado federal Vicentinho (PT-SP) apresentou o requerimento de criação da Frente, com apoio de parlamentares comprometidos com a pauta.

Em 2024, a coleta de assinaturas alcançou o número mínimo exigido, viabilizando o lançamento oficial. Mas ainda faltava o reconhecimento da presidência da Câmara. Foi somente agora, com a assinatura de Hugo Mota, que a Frente passou a existir oficialmente, habilitada a funcionar como espaço de construção de projetos de lei e políticas públicas.

Além da CUT, fazem parte da elaboração da iniciativa as seguintes organizações:

Essas organizações têm se reunido desde agosto de 2022 com o objetivo de aumentar a visibilidade dos trabalhadores da economia informal, promover a transição para a formalidade com direitos e buscar medidas governamentais que promovam maior justiça social para esses trabalhadores.

Também em 2024, as entidades enviaram ao governo federal um documento propondo uma mesa nacional de diálogo, intitulada “Colegiado Intersetorial de Trabalhadores em Emprego Informal no Brasil”. A mesa teria como objetivo construir uma Política Nacional para o setor, orientada pela Recomendação 204 da OIT, e envolveria a participação de diversos ministérios.

Veja aqui as  principais demandas apresentadas para a política nacional do setor.

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Recomendações da OIT e a formalização

Para o secretário-adjunto de Relações Internacionais da CUT, Quintino Severo, que participa da articulação, a Frente nasce com uma base sólida. Ele se refere à Recomendação nº 204 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), aprovada em 2015, que orienta países a criarem mecanismos para a transição da informalidade para a formalidade.

“Baseado nessa recomendação, nós começamos a organizar essas entidades no sentido de construir diálogo com a sociedade para que o trabalho informal seja reconhecido e respeitado acima de tudo”, afirmou.

Ele destacou também que a assinatura marca uma virada. “A partir de agora, a Frente começa a trabalhar, pensar políticas, pensar projetos de lei, inclusive na perspectiva de reconhecer as garantias do trabalho informal. Isso para nós foi uma grande conquista, porque estamos falando de mais de 43% dos trabalhadores que hoje atuam informalmente no Brasil”.

Rodrigo Rodrigues ainda reforçou que a Frente só se tornou possível graças à persistência dos movimentos sociais e sindicais. “Não foi uma conquista isolada. É resultado da pressão, da construção coletiva, de reuniões, debates e da resistência de quem acredita que todos os trabalhadores devem ter seus direitos assegurados, independente da forma como exercem suas atividades.”

Próximos passos

A oficialização da Frente Parlamentar abre caminho para a formulação de projetos de lei que poderão garantir acesso à previdência, à saúde e a mecanismos de proteção contra a exploração. A adoção da Recomendação 204 da OIT pelo Brasil é uma das prioridades.

“Hoje, por exemplo, o trabalhador informal não tem garantia de recolhimento de previdência, não tem direito previdenciário, não tem direito à saúde, não tem um monte de direito. Adotando a recomendação, o país começa a produzir normas e legislações para que essas pessoas tenham condições melhores de vida e de trabalho”, explicou Quintino.

A CUT reforça que a luta não termina com a criação da Frente. O objetivo agora é consolidar políticas públicas que possam transformar a realidade da maioria dos trabalhadores informais, levando dignidade e segurança àqueles que hoje vivem sem qualquer respaldo do Estado.

Recomendação 204 da OIT

Mais de 2 bilhões de trabalhadores em todo o mundo estão na economia informal, o que equivale a 58% do emprego global. Cerca de 80% das empresas também operam informalmente, trazendo sérios desafios ao trabalho digno e à justiça social.

Segundo relatório preparado pela OIT para a 113ª Conferência Internacional do Trabalho (2025), embora a taxa de informalidade tenha caído de 62% em 2004 para 58% em 2024, os números absolutos seguem crescendo. A informalidade compromete direitos, proteção social, produtividade, arrecadação pública e a concorrência leal, dificultando o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, em especial o ODS 8.

O estudo aponta que a informalidade não é opção, mas resultado da falta de empregos formais, baixos rendimentos e ausência de alternativas. Entre os fatores que a agravam estão a fraca governança, regulamentação insuficiente, crises como a pandemia de COVID-19, desigualdade e discriminação contra grupos vulneráveis.

A Recomendação nº 204 da OIT, adotada em 2015, orienta os países a: 1 – facilitar a transição da informalidade para a formalidade, 2 – promover empregos e empresas formais sustentáveis e, 3 – evitar a perda de empregos formais para a informalidade.

O relatório apresenta cinco abordagens principais:

  1. Boa governação e regulamentação robusta, com uso de tecnologias digitais para fiscalização.
  2. Organização e voz dos trabalhadores informais, garantindo participação no diálogo social.
  3. Ambiente favorável a empresas sustentáveis, com simplificação regulatória, acesso a crédito e apoio à produtividade.
  4. Melhores condições de vida e trabalho, com proteção social, salário mínimo, saúde e segurança no trabalho, além de combate à violência e assédio.
  5. Prevenção da informalização e atenção a novas formas de trabalho, como plataformas digitais.

A OIT conclui que enfrentar a informalidade exige ação coordenada e parcerias estratégicas. Prioridades incluem fortalecer a governança, ampliar a representação dos trabalhadores informais, acelerar a aplicação das normas internacionais e assegurar financiamento adequado para políticas de transição.