Escrito por: Hora do Povo
"A promoção da acumulação de capital produtivo, e não apenas o controle da inflação, deveria integrar-se às estratégias de uma política econômica compatível com o desenvolvimento econômico nacional", afirma o economista Miguel Bruno
Parte substancial da poupança das empresas e das famílias têm sido retida na circulação monetário-financeira. Este fato chega a um paroxismo na economia brasileira, pois a renda de juros no período 1993-2005 atingiu a média de 29% da renda disponível bruta, segundo dados das Contas Nacionais do IBGE", afirma o economista Miguel A. P. Bruno, no texto "Acumulação de Capital, Distribuição e Crescimento Econômico no Brasil: uma Análise dos Determinantes de Longo Prazo", publicado neste mês pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
O IBGE conceitua como renda disponível bruta o saldo resultante da renda nacional bruta menos as transferências correntes enviadas e recebidas do exterior.
Segundo Bruno, o gasto com juros representa "uma excepcional carga financeira sobre o produto [PIB] e que funciona como um freio ao crescimento do estoque de capital fixo produtivo, impedindo o país de trilhar trajetórias de longo prazo mais consentâneas com as demandas sociais em termos de geração de emprego e de renda". Ou seja, trata-se de uma brutal transferência de recursos da expansão da atividade produtiva para os juros, uma vez que o capital fixo produtivo engloba os estoques em máquinas e equipamentos mais as construções não-residenciais.
O trabalho do pesquisador analisa as principais tendências do crescimento econômico brasileiro no período de 1950-2006. Ele alerta que "no período pós-liberalização, novas oportunidades surgiram para o país reencontrar uma nova trajetória de desenvolvimento. Mas apesar da estabilidade de preços e das condições favoráveis do cenário internacional, a performance macroeconômica brasileira tem permanecido muito abaixo da média histórica e do que se espera para uma economia ainda em desenvolvimento. Recentemente, a melhora no curto prazo de alguns indicadores macroeconômicos tem sido interpretada como se já representasse a entrada da economia brasileira em um longo período de crescimento econômico sustentável. No entanto, uma investigação dos determinantes de longo prazo do crescimento revela uma baixa propensão a investir do lucro macroeconômico e a permanência de taxas ainda muito baixas de crescimento do estoque de capital fixo produtivo".
INFLAÇÃO
O economista argumenta que "a promoção da acumulação de capital produtivo, e não apenas o controle da inflação, deveria integrar-se às estratégias de uma política econômica compatível com o desenvolvimento econômico nacional". Bruno observa que para os neoliberais "a acumulação de capital é melhor promovida pelas forças de mercado, desde que estas possam contar com instituições eficientes ou marcos regulatórios apropriados. Todavia, é no período de liberalização comercial e financeira, que economias como a brasileira apresentam as mais baixas taxas de acumulação de capital fixo produtivo de toda a sua história industrial".
Constata Bruno que o período entre 1950-1980 "foi particularmente notável", registrando elevadas taxas de expansão do Produto Interno Bruto (PIB). "Em conseqüência, a renda per capita e o nível geral de emprego mantiveram-se sob trajetórias de forte expansão, e o país pôde consolidar sua base industrial, deixando para trás sua condição de economia primário-exportadora".
Ele ressalta que o período de 1966-1980 apresentou altas taxas de lucro e de acumulação de capital fixo produtivo e "com expansão sustentada do emprego e da renda. O processo de acumulação foi predominantemente intensivo, com ganhos elevados de produtividade do trabalho e forte progressão da intensidade do capital".
DECLÍNIO
Entre 1984 e 1993, ele aponta que as quedas das taxas de lucro e de acumulação sinalizaram "a entrada da economia brasileira em um longo período de dificuldades macroeconômicas e estruturais".
"O processo de liberalização comercial e financeira, com as transformações estruturais iniciadas nos anos 1990, reconfiguraram de modo relativamente rápido o ambiente institucional e macroeconômico. Em conseqüência, no período 1996-2006, um novo regime de crescimento surge dessas mudanças estruturais, mas apresenta baixa taxa de acumulação de capital fixo produtivo, apesar de a taxa de lucro médio estar sob tendência de crescimento desde 1994", diz Bruno.
"A compreensão das especificidades do atual padrão de acumulação exige novas análises que possam explicitar os vínculos entre a acumulação de base rentista e patrimonial e o crescimento do estoque de capital fixo produtivo", sublinha o economista, acrescentando: "Constatou-se que, sob as condições estruturais que o caracterizam, o aumento da parcela dos lucros no produto não tem contribuído significativamente para elevar a taxa de investimento, porque a parcela investida do lucro macroeconômico está em declínio tendencial".