Escrito por: Rosely Rocha
Empresa contratante de pessoa jurídica não pode exigir cumprimento de horário e trabalho presencial, entre outras normas. Conheça seus direitos
Cada vez mais empresas usam o artifício de contratação de trabalhadores e trabalhadoras no regime de Pessoa Jurídica (PJ), a chamada pejotização, que apesar de ser permitida pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), precisa estar adequada a algumas normas para não se caracterizar fraude trabalhista, quando o patrão não assina a carteira de trabalho para não pagar o 13º salário, vale transporte e férias remuneradas, entre outros direitos.
Para que você entenda a diferença entre pejotização e fraude trabalhista, o advogado Ricardo Carneiro, do escritório LBS Advogados e Advogadas, que assessora a CUT Nacional, explica alguns pontos fundamentais entre as duas formas de contratação.
Quando o trabalhador tem que entender se ele é pejotizado ou se a empresa está cometendo uma fraude trabalhista?
Carneiro - Geralmente quando se fala de trabalhadores pejotizados nós estamos nos referindo ao trabalho autônomo que tem certas características, como o próprio termo diz, autônomo, o que demanda uma autonomia do trabalhador sobre o trabalho, sobre o serviço prestado. Então, por exemplo, o trabalhador autônomo tem a liberdade dos horários, ele fixa a sua própria remuneração, ele inclusive, tem autonomia para indicar um substituto quando em determinado dia ele não puder prestar os serviços.
O que diz a CLT sobre a contratação de PJ?
Carneiro - O que está acontecendo hoje em dia, todavia, é a contratação de autônomos, mas fraudando uma típica relação de emprego. O artigo 3º da CLT, ele diz claramente: “considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”.
O que caracteriza a fraude trabalhista?
Carneiro – A fraude se caracteriza quando houver uma subordinação, um trabalho não-eventual, ou seja, um trabalho contínuo que faz parte da atividade do empregador, sob a dependência desse empregador, recebendo ordens, sem autonomia que é típica do trabalho autônomo e mediante um salário definido pelo empregador. Quando estão presentes esses elementos isso caracteriza uma relação de emprego. Esse trabalhador tem de ser enquadrado como um empregado CLT e com todo o conjunto de direitos previstos como estar no Regime Geral da Previdência Social, além é claro, de todos os demais direitos como 13º, férias, etc...
O trabalhador pejotizado é obrigado a cumprir horário e presença na empresa?
Carneiro - Geralmente, quando o empregador começa a estabelecer determinadas condições para a prestação de serviços, isso gera uma subordinação que não é típica do trabalho autônomo. Então, se o empregador fixa a jornada de trabalho, os dias da semana em que o trabalhador tem que comparecer e diz qual é a remuneração fixa isso caracteriza uma típica relação de emprego.
Há um entendimento de que o trabalhador com ensino superior e que ganhe, no mínimo, o teto do INSS ele não tem direito a reivindicar vínculo trabalhista. Isto procede?
Carneiro - Isso envolve uma figura que foi importada na CLT, na reforma trabalhista de 2027, que são os hipersuficientes. A hipersuficiência é quando o empregado é portador de diploma de nível superior e recebe salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. O teto hoje do INSS é de R$ 8.157,41. Para caracterizar a hipersuficiência é preciso uma combinação do valor do salário e o nível superior de ensino. Mas volto a dizer, presentes os elementos que caracterizam a relação de emprego, previstos no artigo 3º da CLT essa relação será de emprego, não há uma relação pejotizada sem autonomia do trabalhador, independente do grau de ensino dele.
Muitas vezes, as condições são impostas, às vezes, com o intuito de fraudar essa relação de emprego, tendo em vista as condições reais da apreciação de serviço. O princípio do direito de trabalho, da realidade em que as condições de trabalho são impostas, esse princípio supera tudo. Então, por mais que a empresa negocie um trabalho de PJ, ou negocie um trabalho autônomo, com um trabalhador mesmo que seja legalmente reconhecido como hipersuficiente, essas condições caracterizam uma relação de emprego.
A hipersuficiência pode gerar uma presunção, mas ela pode ser anulada tendo em conta a realidade dos fatos de como essa relação de trabalho ali é gerida.
Mesmo que o trabalhador PJ tenha um contrato por escrito se ele tiver de cumprir horários e ser subordinado é fraude trabalhista?
Carneiro - Mesmo que a pessoa tenha assinado um contrato entre as partes, por exemplo, o princípio que prevalece é o princípio da realidade. Se o trabalhador não tem autonomia, por mais que um contrato por escrito diga que ele tem de cumprir horários e subordinação ele pode recorrer à justiça do trabalho para obter seus direitos.
Até quando esse trabalhador pode recorrer à justiça do trabalho?
Carneiro – O prazo da justiça para julgar as relações de trabalho, mesmo numa relação autônoma, em que o trabalhador tenha sido obrigado a abrir uma MEI ou outro modelo de empresa para exercer uma função e esse “contrato” se encerra, o prazo prescricional será de dois anos para entrar com a ação e, para discutir o pagamento de direitos retroativos a cinco anos. Este é o mesmo prazo de um trabalhador CLT tem de entrar com ação na justiça para reivindicar qualquer direito seu que não tenha sido respeitado pelo empregador.
Algumas empresas recorrem a um contrato societário, permitindo que o sócio majoritário termine com essa sociedade. Isso também é fraude trabalhista?
Carneiro – Essa é uma relação muito comum em que a pessoa pode ser sócia minoritária de uma empresa e isso está correto se a relação societária se desenvolve corretamente. Ou pode ser uma fraude se a relação societária é lidada de uma forma que caracterize uma relação de emprego, assim, como também no campo das cooperativas.
O que o trabalhador pode fazer se identificar que sua relação com a empresa é uma fraude trabalhista?
Carneiro - Eu recomendo sempre quando o trabalhador tiver dúvida sobre o seu direito, procure uma assessoria jurídica junto ao sindicato da sua categoria, seja metalúrgico, bancário, professor e se informe sobre os seus direitos.