Escrito por: André Accarini
Com presença expressiva e atuação qualificada, a CUT teve papel central na 5ª CNPM. A participação reafirmou o compromisso da Central com políticas públicas, igualdade de gênero e democracia
Brasília foi palco, entre os dias 29 de setembro e 1º de outubro de 2025, da 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (6ª CNPM), instância máxima de participação social voltada à formulação de políticas públicas para a promoção da igualdade de gênero no Brasil.
Com o lema “Mais direitos, mais democracia, mais igualdade”, o encontro mobilizou cerca de seis mil mulheres de todas as regiões do país. Entre elas, centenas de trabalhadoras da CUT, que desempenharam papel decisivo nos debates e nas deliberações.
A conferência, retomada após quase dez anos de interrupção, marcou um momento simbólico da reconstrução democrática e da reafirmação das mulheres como protagonistas na formulação de políticas públicas.
Para Amanda Corcino, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, a conferência foi um marco político e simbólico para o país.
“A CUT mobilizou toda a sua base, mostrando sua força e sua relevância num dos momentos mais emblemáticos desde o golpe contra a presidenta Dilma. Foram as mulheres as mais afetadas pelo golpe e pelo avanço do fascismo. Por isso, essa conferência teve um significado tão profundo”, afirmou.
A CUT mostrou sua força em uma das conferências mais emblemáticas da história das mulheres- Amanda Corcino
Segundo Amanda, a presença da CUT foi massiva e qualificada em todas as etapas — das conferências livres e estaduais à etapa nacional.
“A CUT tem o compromisso histórico de incidir sobre as políticas públicas. Nosso papel é garantir que as demandas das mulheres trabalhadoras se transformem em ações concretas de Estado e essa conferência foi o espaço ideal para isso”, ressaltou.
Participação
“As mulheres cutistas participaram ativamente da etapa nacional, levando a voz da mulher trabalhadora para dentro dos espaços de decisão. Apresentamos propostas concretas sobre emprego, autonomia econômica, saúde, moradia, meio ambiente e enfrentamento à violência”, disse a secretária adjunta da Mulher Trabalhadora da CUT, Mara Feltes.
A dirigente destacou que o evento superou as expectativas e representou a retomada do diálogo social como instrumento de formulação de políticas públicas.
“Esperavam 3 mil mulheres, mas mais de 6 mil circularam pelo espaço. Foi uma conferência plural, diversa e profundamente democrática, com representação de mulheres negras, indígenas, com deficiência e LBTs. Esse foi um acerto político que expressa o Brasil real”, avaliou.
Imagina que inicialmente eram para 3 mil pessoas e circularam 6 mil mulheres naquele espaço. Foi a maior conferência já feita no nosso país- Mara FeltesMara afirmou ainda que a participação da CUT foi essencial na consolidação das 60 propostas aprovadas em plenário, resultado do intenso trabalho coletivo nos 15 eixos temáticos.
Na plenária final, o relatório com as propostas foi aprovado em consenso, com 98% de votos favoráveis. As sugestões estão divididas em 15 eixos temáticos que irão compor as diretrizes do novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Entre as propostas aprovadas estão:
O próximo passo é fazer consolidar as propostas e garantir que aquilo que foi plantado agora possa florescer.
Mara também destacou a dimensão simbólica e afetiva do encontro. “Foram dez anos de silêncio, e agora as mulheres voltaram a falar, a propor e a decidir. Só o fato de uma trabalhadora participar, ser ouvida e reconhecida já é transformador. A conferência foi um espaço de poder, de pertencimento e de reconstrução da democracia.”
“Essa conferência plantou uma semente de mudança. Cabe a nós fazer com que ela floresça, garantindo que as vozes das mulheres que reconstruíram o país ecoem em cada política pública”, pontuou a dirigente
Representatividade
A secretária adjunta da Mulher Trabalhadora da CUT ressaltou o acerto político em garantir representatividade nas delegações.
“Nós tivemos um acerto ao assegurar que nas delegações houvesse diversidade, com intensa participação de mulheres pardas, negras, indígenas, mulheres com deficiência e LBTs (lésbicas, bissexuais e trans)ai. Esse compromisso foi mantido em todas as etapas do processo. Foi difícil, porque somos um país muito preconceituoso, mas foi um acerto termos feito isso”, disse.
Mara Feltes destacou a dimensão humana e simbólica da conferência, lembrando mulheres que viajaram dias para participar e se emocionaram com a experiência. Ela afirmou que o encontro marcou o fim de um período de silenciamento político, com salas lotadas e grande participação. Ressaltou o papel estratégico da CUT, presente em todos os ramos e temáticas, e elogiou a estrutura acolhedora do evento, com espaços para mães, saúde, economia solidária e memória histórica. Para Mara, participar já é transformador, e a CUT se orgulha de levar sua voz sobre saúde, trabalho, violência e meio ambiente.
A CUT e a reconstrução democrática
A presença da CUT na 6ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres reafirmou o protagonismo das trabalhadoras organizadas na formulação de políticas públicas. A Central não apenas mobilizou sua base, como também contribuiu tecnicamente para a elaboração das propostas que orientarão o novo Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.
Ao defender a transversalidade de gênero nas políticas de Estado, a valorização do trabalho das mulheres e o enfrentamento à violência, a CUT mostrou que incidir sobre políticas públicas é parte essencial de sua missão histórica.
Abertura e painel de políticas públicas
A cerimônia de abertura, no dia 29, contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, da ministra das Mulheres, Márcia Lopes, além de representantes de diferentes frentes do movimento feminista – da Marcha das Mulheres Negras, da Marcha das Margaridas, da Marcha da Visibilidade Trans e da Marcha das Mulheres Indígenas. O ato deu o tom da conferência ao reconhecer que a luta das mulheres, em sua diversidade, é elemento central para a democracia brasileira.
No mesmo dia, o painel “Políticas públicas e ações para as mulheres do Brasil” reuniu dez ministras de Estado, que detalharam ações já implementadas e desafios que permanecem. Márcia Lopes destacou a necessidade de ampliar estruturas institucionais nos estados que ainda não possuem secretaria dedicada às mulheres. Esther Dweck, ministra da Gestão e Inovação, apresentou medidas voltadas para ampliar a presença feminina no serviço público, como cotas para mulheres em situação de violência no Concurso Nacional Unificado.
Outras intervenções ressaltaram questões urgentes: Anielle Franco reforçou a defesa da equiparação salarial; Sonia Guajajara anunciou a Conferência Nacional das Mulheres Indígenas; Luciana Santos denunciou desigualdades salariais persistentes; Macaé Evaristo alertou para situações de trabalho análogo à escravidão entre empregadas domésticas; e Marina Silva vinculou igualdade de gênero e justiça climática.
A presença de múltiplas vozes no painel deixou evidente que a transversalidade de gênero deve atravessar todas as políticas de Estado.
Painéis temáticos: diversidade de enfoques
O segundo dia foi dedicado a doze painéis temáticos realizados simultaneamente. Cada espaço reuniu especialistas, parlamentares, representantes do judiciário e lideranças sociais para debater dimensões específicas das políticas públicas para as mulheres.
Entre os temas, destacaram-se: o papel do judiciário no enfrentamento à violência; caminhos para a autonomia econômica; justiça de gênero e étnico-racial; impactos das mudanças climáticas sob a ótica das mulheres; violência política e nas redes; desafios da implementação de políticas públicas em âmbito federativo; envelhecimento digno; democracia e soberania na perspectiva da emancipação feminina; saúde, assistência social e educação com recorte de gênero.
As falas ressaltaram a necessidade de consolidar instrumentos legais já existentes e de criar mecanismos de acompanhamento e execução efetiva das políticas. Foi consenso que, sem recursos financeiros e integração entre União, estados e municípios, muitas conquistas correm risco de não se materializar no cotidiano das mulheres.
Espaços de Diálogo: núcleo da democracia participativa
Na tarde do dia 30, ocorreram os Espaços de Diálogo, considerados a espinha dorsal do processo conferencial. Em 20 grupos simultâneos, distribuídos em 15 eixos temáticos, delegadas discutiram propostas formuladas nas etapas municipais e estaduais. Os temas abrangeram trabalho e autonomia econômica, cuidado, empreendedorismo, saúde integral, violência de gênero, participação política, direito à terra, enfrentamento do racismo, políticas para juventude e idosas, cultura e institucionalização de organismos de políticas para mulheres.
O método adotado garantiu que a diversidade de realidades locais fosse contemplada. Cada grupo teve como tarefa analisar, consolidar e priorizar propostas, em um exercício de democracia participativa que fortalecerá o documento final da conferência. Esse documento orientará a atuação do governo federal, servindo como base para políticas públicas nos próximos anos.
Dimensão cultural e mobilização nas ruas
A 5ª CNPM também se caracterizou como um espaço de valorização da diversidade cultural e criativa das mulheres brasileiras. A programação contou com a Mostra de Economia Solidária e Criativa, reunindo produtos de trabalhadoras de diferentes regiões do país; lançamentos de livros autorais; exposições de artistas plásticas; e a Alameda “Mulheres na luta por democracia, igualdade e soberania”, espaço simbólico que reafirmou a trajetória histórica de luta das mulheres.
A Tenda Mulheres e Clima foi outro destaque. Com apresentações culturais, rodas de conversa e intercâmbio de iniciativas de movimentos sociais, o espaço abordou os impactos das mudanças climáticas na saúde reprodutiva e nas condições de vida das mulheres. Foram recebidas cartas que serão apresentadas na COP30, reforçando a dimensão internacional da luta por justiça climática.
No mesmo dia, milhares de mulheres tomaram as ruas de Brasília na Marcha das Mulheres. O ato partiu do Museu Nacional e seguiu até o Congresso Nacional, denunciando as múltiplas formas de violência sofridas diariamente por mulheres brasileiras e cobrando respostas efetivas do poder público. A marcha reafirmou que a pauta feminista não se restringe às instituições, mas se materializa também na ocupação dos espaços públicos.
Encerramento e propostas finais
O último dia da conferência foi dedicado à plenária final, no Auditório Maria da Penha. As propostas debatidas nos grupos foram apresentadas, discutidas e votadas coletivamente, consolidando um documento que reúne prioridades estratégicas para as políticas de gênero no país. Também foram lançadas duas cartilhas: Direitos de Mulheres Trans e Travestis e Ações Climáticas, fruto de articulações realizadas ao longo do encontro.
O encerramento contou ainda com a assinatura de atos do governo federal, apresentações culturais e o Festival “Democracia, Igualdade e Soberania”, que reuniu manifestações artísticas em celebração à diversidade e à resistência das mulheres.
A CUT na Conferência
[Espaço reservado para inserção posterior]
A 5ª CNPM marcou a retomada de um processo conferencial interrompido por quase uma década e reafirmou que a participação social das mulheres é essencial para a democracia brasileira. Ao articular debates técnicos, deliberações políticas, mobilização nas ruas e celebrações culturais, a conferência apontou caminhos para a construção de um país mais justo, igualitário e democrático.
A ministra das Mulheres, Márcia Lopes, reforçou que a construção desses instrumentos não termina com a conferência. “A luta não acaba nunca! Precisamos construir … um mundo onde as mulheres se sintam livres e em que não haja nenhum tipo de violência contra elas.”