Escrito por: CUT-PE
“A junção da capacidade de sonhar com a capacidade de lutar é o que faz o povo se unir e batalhar pelos seus direitos”, afirmou o presidente da CUT Pernambuco
Como parte do projeto “Pesquisa, Organização e Fortalecimento dos Direitos e do Diálogo Social com os Trabalhadores de Aplicativos de Entrega em Brasília e Recife”, promovido pela CUT e Instituto Observatório Social (IOS) com apoio da Organização Internacional do Trabalho (OIT), entregadores e entregadores por aplicativos debateram a organização da categoria em busca de direitos e dignidade no trabalho, nesta segunda-feira (8), na capital pernambucana.
Sem banheiro e nem lugar para carregar o celular, jornadas exaustivas e baixa remuneração, sem auxílio doença ou mesmo de acidentes, bloqueios sem explicação e falta de transparência entre aplicativo e entregadores e entregadoras são alguns dos problemas enfrentados pela categoria no seu cotidiano e denunciados na oficina “Organização, Direitos e Trabalho Decente para Entregadores por Aplicativos”, que aconteceu na sede do Sindicato dos Servidores Públicos Federais do Estado de Pernambuco (Sindsep), no centro de Recife.
Estas más condições de trabalho foram comprovadas na pesquisa, o que fica claro que os pilares do trabalho decente, como os direitos e princípios fundamentais do trabalho, a promoção do emprego de qualidade, a extensão da proteção social e o diálogo social, não estão sendo cumpridos, segundo dados do sumário executivo do estudo.
“No 13º Congresso, em 2019, a CUT decidiu lutar para conquistar direitos para esta categoria tão explorada e lutar por trabalho decente. A pesquisa indica que os entregadores trabalham muito, têm pouco tempo de descanso e não recebem o quanto deveriam e a gente apresentou os gráficos com o objetivo de conscientizar a categoria de que para garantir direitos é preciso se organizar e para que essa organização aconteça é necessário conhecer os problemas, as demandas, os objetivos e sonhos desses trabalhadores e trabalhadoras e é essa a importância desta oficina”, explicou o secretário de Relações Internacionais, António Lisboa.
Segundo a Secretária-Geral do IOS, Lucilene Binsfeld, conhecida com Tudi, a OIT tem uma expectativa muito grande no que diz respeito a organizar a luta por direitos no mundo rumo ao trabalho decente e este projeto da CUT e IOS tem a responsabilidade de levar o estudo e a campanha de comunicação e a organização como referências no mundo todo.
Para Tudi, esse mundo do trabalho “moderno” passa a exigir que o próprio trabalhador garanta os seus meios de produção, no caso dos aplicativos, o entregador ou a entregadora disponibiliza sua moto, sua bicicleta, compra a bag e ainda precisa pagar pela água, se sentir sede durante a jornada.
“As condições de trabalho estão cada vez mais precarizadas, mas é possível organizar a categoria por melhores condições de trabalho e isso a gente tem certeza. A CUT também passou por diversas dificuldades para se organizar, mas é preciso e possível. Portanto, essa oficina hoje tem como objetivo, também, contribuir com a organização desses trabalhadores/as na luta pelos seus direitos”, destacou ela.
O pesquisador da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Roberto Veras, apresentou uma síntese da pesquisa e contou todo o processo das entrevistas virtuais. Além disso, a música dos Paralamas do Sucesso, Capitão de Indústria, foi tocada na oficina para dar clima ao debate, porque a letra fala sobre a exploração do capitalismo e a falta que as trabalhadoras e os trabalhadores sentem de ter tempo de ter ou de ser por trabalhar demais.
Durante a oficina, também foi apresentado um vídeo que mostra a história da CUT e da fundação da maior central sindical da América Latina com objetivo de mostrar que é possível organizar a classe trabalhadora para mudar a realidade da categoria.
O presidente da CUT Pernambuco, Paulo Rocha, conhecido como Paulinho, fez uma alusão histórica muito pertinente, quando comparou o trabalho dos entregadores de aplicativo com a revolução industrial, que boa parte tinha a escravidão, jornada de trabalho de 16 horas por dia para homens, mulheres e crianças, e ainda sem direitos. Além disso, Paulinho destacou o papel da CUT e a importância de sonhar e lutar.
Segundo ele, há muita coisa para remar e muitas para conquistar e a realização dessa oficina é um dos passos que vamos dar para a conquista dos direitos da categoria dos trabalhadores e trabalhadoras de aplicativo. A CUT já é herdeira da luta dos trabalhadores e o nosso princípio é melhorar salário, condição de trabalho, alimentação, saúde, moradia, criar seus filhos, um trabalho com a valorização digna. A junção da capacidade de sonhar com a capacidade de lutar é o que faz o povo se unir e batalhar pelos seus direitos e é isso que estamos vendo aqui”, destacou.
Na próxima quarta-feira (10) a mesma oficina acontecerá em Brasília.
Não sabem quanto ganham
O pesquisador da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Roberto Veras, apresentou uma síntese da pesquisa e contou todo processo das entrevistas virtuais com mais de 40 entregadores por aplicativos em Recife, tanto os que trabalham com moto, quanto os que entregam de bicicleta. Ele também destacou o perfil da categoria, que são grande parte de homens, não brancos, jovens e com ensino médio. Roberto também fez questão de lembrar um ponto importante do estudo: será que a categoria sabe mesmo qual é a renda líquida do seu trabalho como entregador ou entregadora?
“Durante a pesquisa ficou claro que muitos não sabem exatamente quanto ganham, nunca fizeram uma estruturação da receita e despesa de fato. Os entregadores, em grande parte, não colocam na ponta do lápis a gasolina, manutenção da moto, almoço, o plano do celular ou qualquer outra despesa relacionada com a atividade que está desenvolvendo e com isso não conseguem saber qual é a real renda. E isso tudo precisa ser levado em consideração, porque no comércio ou escritório as despesas são da empresa. Com esta conta o líquido é muito diferente”, explicou.
Mudar a realidade
O entregador e presidente do Sindicato dos trabalhadores empregados e autônomos com moto e bicicleta por aplicativos em Pernambuco (SEAMBAPE), Rodrigo Lopes Correia, disse que as condições de trabalho, as responsabilidades e os riscos que os entregadores correm são inúmeros e o reconhecimento de tamanho trabalho não tem sido o suficiente.
“É muito importante atividades com esta oficina para que as entregadoras e os entregadores entendam que inicialmente parece ser mais fácil e livre, e que você faz seu horário, mas não é bem assim. O trabalhador não tem liberdade, os aplicativos penalizam, bloqueiam por determinado período, entre outros, fazendo com que a gente se torne dependente de entrega”, destaca Rodrigo.
Segundo ele, sempre é bom lembrar que os algoritmos dos aplicativos, que fortemente auxiliam para essa exploração, foram criados por programadores que são pagos pela empresa e, além disso, as avaliações são falhas e não há como dialogar para resolver qualquer questão sobre o cotidiano da categoria.
“Se o trabalhador ficar logado 10 horas se torna um excelente profissional, mas se optar por fazer seu horário e ficar somente duas horas já é interpretado como um funcionário que não serve para a empresa. É recorrente ver reclamações dos entregadores que apresentam mais de 1500 corridas, tudo cinco estrelas, e apenas uma corrida, que não é bem avaliada, pode ocasionar em um bloqueio, uma queda no desempenho no aplicativo e não tem nenhum canal para responder e reivindicar. A gente quer mudar isso e deixar de ser dependente de entrega, a gente quer direitos e dignidade, só isso”, destacou.
A entregadora, Maria Damiana, que também é diretora do SEAMBAPE, complementou a fala de Rodrigo e disse que a oficina foi um norte para a vida dela, tanto de sindicalista quanto acadêmica.
“Eu quero continuar ajudando a categoria no sindicato, mas também vou me dedicar a este tema no meu trabalho de conclusão de curso da faculdade de direito que estou fazendo. Quero juntar estes resultados da pesquisa, os nossos debates, a minha experiência e meu estudo para contribuir com a organização da categoria rumo às conquistas de direitos e um trabalho digno. Juntos a gente consegue, tenho certeza”, ressaltou.
A gente não se entrega
Durante a oficina foi apresentada para as entregadoras e os entregadores por aplicativos a campanha de comunicação “A gente não se entrega” com objetivo da CUT se aproximar com a categoria e para divulgar os resultados da pesquisa de forma mais dinâmica. Tem site, Facebook e Instagram.
“A campanha foi feita para e com os entregadores e as entregadoras por aplicativos e é baseada na realidade deles e delas. Ter a participação da categoria não só enriquece muito nossa campanha, como nos aproxima das trabalhadoras e dos trabalhadores e nos proporciona seguir juntos e juntas em defesa dos direitos e contra a exploração destas empresas de aplicativos”, destacou o Secretário-Adjunto de Comunicação, Admirson Medeiros Ferro Junior, conhecido como Greg.