Escrito por: Susana Santos/Hora do Povo

Cristina Kirchner rejeita tentativa de...

O país construiu um mercado interno com inclusão social e políticas anti-crise. Esta é a causa da irritação do FMI

"Onde estava o FMI, que não pode advertir sobre nenhuma crise? Alguém conhece alguma sanção do FMI, alguma decisão contra aqueles que, enriquecendo-se, quebraram o mundo? Não. A primeira medida tomada pelo FMI é contra a Argentina", afirmou a presidente Cristina Kirchner respondendo ao Fundo Monetário Internacional, um dia após que esse organismo emitisse uma moção de censura contra a Argentina pelas estatísticas oficiais do índice de preços ao consumidor (IPC) e o cálculo do PIB, interferindo nas questões internas do país. 

Cristina questionou o papel do Fundo na crise provocada pela especulação nos Estados Unidos e na Europa. "Onde estava o FMI quando se formaram, não apenas bolhas, mas verdadeiros balões financeiros? Onde estava um de seus diretores [Rodrigo Rato] quando o Bankia, que ele dirigia, teve que ser auxiliado com bilhões de euros? [injeção de recursos públicos à banca espanhola, quebrada pela especulação]. Hoje a Espanha tem 26% de desempregados, em sua maioria jovens. Em quais estatísticas aparecem essas tragédias? Quais são os parâmetros ou ‘procedimentos’ com que o FMI analisa países quebrados que continuam endividando-se, com povos desesperançados?", apontou, perguntando ainda "o que acontece com os países emergentes que sustentamos a economia global na última década e hoje querem que tomemos conta de pratos quebrados por outros?". E ainda: "FMI+FBI contra a Argentina. Não se assustem, o FBI são os Fundos Abutres Internacionais [na sigla em espanhol]".

O Governo argentino alertou sobre a relação com os fundos especulativos norte-americanos que tentam achacar milhões de dólares do país, depois de terem recusado a oferta da Casa Rosada de comprá-los por seu valor real. "Não me parece casual o timing, o momento em que o fundo decide soltar esse informe", disse o ministro de Economia, Hernán Lorenzino. Indicou que o anuncio da moção por Cristine Lagarde, gerente do FMI, ocorreu "no meio dessa discussão dos títulos" cujo próximo passo será a exposição oral do governo, dia 27, em Nova Iorque.

"Não fizeram nada na crise que arrebentou a economia de muitos países. A 1ª medida que toma o FMI é contra a Argentina. Aluna exemplar do FMI nos anos 90, que seguiu todas e cada uma das receitas, e quando estourou em 2001 soltaram-lhe a mão", assinalou a presidente.

Cristina considerou que essa "parece ser a verdadeira causa da irritação do FMI. A Argentina é um palavrão para o sistema financeiro global de rapina e seus derivados. O nosso país construiu um mercado interno com inclusão social e políticas anti-crise". O ministro Lorenzino a complementou, denunciando que "a moção de censura do FMI responde à decisão do país de proteger a indústria nacional e o emprego, de se financiar prescindindo do mercado financeiro e de dizer não aos fundos abutres".  

Cristina contrapôs a situação argentina de 2003 com a atual e assinalou que, naquela época, o país tinha "166% de um PBI raquítico de dívida, 90% em moeda estrangeira. Hoje a dívida ao setor privado nacional e internacional está só em 14% de um PIB robusto. Apenas 10% em moeda estrangeira, 32% de dívida intra setor público".

Entre os índices favoráveis, a presidente incluiu "6.9% de desempregados", e "o melhor salário nominal da América Latina e de poder aquisitivo medido em US$". O salário mínimo argentino é hoje de 2.875 pesos, aproximadamente 1.350 reais.

"Um posicionamento de tal natureza com respeito à Argentina constitui não só um novo erro do FMI, mas também um claro exemplo de tratamento desigual e de duplo padrão deste organismo em sua relação com certos países membros. Esse é o mesmo Fundo que se mostra complacente com declarações inexatas de dados e com frustradas políticas que conduziram à crise global. Um FMI que, sendo consciente que suas receitas não funcionam, não se arrepende de suas prescrições", declarou o ministro.

O FMI estipulou um prazo de oito meses para que o governo argentino aplique medidas ao Instituto Nacional de Estatística e Censo (INDEC). Lorenzino lembrou que o país planeja lançar um novo índice de preços ao consumidor, chamado IPC-Nacional, até o fim do ano, em substituição ao atual índice de preços, o IPC-GBA, e que "o Fundo está a par disso". "Acreditamos (que o novo índice) entrará em vigor no último quadrimestre de 2013, o FMI só expressou sua inconformidade com a política independente do país", acrescentou.

O representante do Brasil no FMI, Paulo Nogueira Batista, qualificou de "contraproducente" a censura feita à Argentina.