Escrito por: Luiz R Cabral
“Essas pessoas estavam pedindo a volta da ditadura militar e a Constituição não permite anistiar quem cometeu esse tipo de crime”, alerta vice-presidenta da CUT
Contrariando a vontade da maioria da população que aprova a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), de acordo com as últimas pesquisas, a Câmara Federal segue ignorando as pautas de interesse social e foca no interesse político e econômico de seus integrantes.
Depois de aprovarem na noite desta quarta-feira (17), o requerimento de urgência para o Projeto de Lei (PL) 2162/2023, que prevê anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aos demais réus dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, por 311 votos a favor, 163 contrários e 7 abstenções, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou nesta quinta-feira (18) pela manhã, a escolha do deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) para relatar o projeto de anistia. O parlamentar terá a tarefa de construir um texto que concilie pressões da base bolsonarista com a resistência de partidos que rejeitam perdoar crimes contra a democracia.
O aval à urgência permite que o texto seja votado diretamente em plenário, sem passar por comissões, acelerando a tramitação. A decisão de pautar a matéria foi tomada pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), após reunião com líderes partidários. Ele afirmou que o Brasil precisa de “pacificação”.
Segundo a vice-presidenta da CUT Juvandia Moreira, o povo brasileiro não pode aceitar essa anistia que contraria o que diz a Constituição brasileira.
“Falar em anistiar pessoas que tentaram dar golpe, como Bolsonaro, é algo que não podemos aceitar. Isso ficou comprovado, provas foram apresentadas no Supremo pelo procurador-geral e confirmadas pelos ministros na condenação desses réus. E não se trata só dele. Estamos falando também de quem, no dia 8 de janeiro, tentou montar bombas, destruiu patrimônio público, invadiu prédios, depredou obras de arte. Essas pessoas estavam pedindo a volta da ditadura militar. E isso é crime. A Constituição não permite anistiar quem cometeu esse tipo de crime. Não podemos aceitar que isso aconteça”, afirmou.
Anistia = esquecimento. Não podemos esquecer
Anistia. A palavra, de origem latina — amnestia, que vem do grego amnestía — significa, literalmente, “esquecimento”. Mas como esquecer quem não aceitou a decisão soberana do povo brasileiro nas urnas nas últimas eleições presidenciais, atentou contra a democracia de nosso país de forma criminosa com uma tentativa de golpe de Estado e, ao longo de um mandato, entre outras ações, foi responsável pela morte de cerca de 700 mil pessoas pelo Covid 19, além de zombar das vítimas. Como esquecer de quem instalou um gabinete do ódio para espalhar desinformação e usou a máquina pública em benefício próprio?
Por isso, o Projeto de Lei da Anistia coloca em debate a memória, a justiça e os limites do perdão político, questionando se determinadas ações podem, de fato, ser esquecidas, ou se é, mais uma vez, uma manobra política que beneficia aqueles que desprezam a democracia e fazem pouco caso da constituição brasileira.
O que é o Projeto de Lei da Anistia
O Projeto de Lei da Anistia, PL 2858/2022, surgiu inicialmente em novembro de 2022, de autoria do então deputado Major Vitor Hugo (PL-GO). A proposta original pretendia perdoar aqueles que participaram dos protestos realizados em 30 de outubro de 2022, após a derrota de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais. Na ocasião, manifestações bloquearam rodovias em várias regiões do país, resultando em diversas prisões.
Em 2023, o projeto foi ampliado para contemplar os envolvidos nos atos de 8 de janeiro, quando manifestantes atacaram o Congresso, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. O projeto prevê:
O que está por trás da PL da Anistia é livrar Bolsonaro e a cúpula golpista da condenação
Embora a bancada bolsonarista defenda a anistia como proteção a manifestantes comuns, a análise detalhada indica que a medida favorece sobretudo a cúpula golpista:
Jair Bolsonaro, revogando sua inelegibilidade;
Partido Liberal, com anistia de multa de R$ 22 milhões por litigância de má-fé;
Os outros sete integrantes da cúpula golpista condenados pelo STF por golpe de estado.
Abrangência duvidosa
O pacote não se limita aos crimes de depredação de 8 de janeiro. Prevê anistia a crimes eleitorais, abuso de poder político, manifestações realizadas entre outubro de 2022 e a data da lei, bem como sanções da Justiça Eleitoral e restrições à liberdade de expressão impostas pelo Judiciário.
Constrangimento ao Judiciário
Alguns projetos contêm dispositivos que:
Impedem investigações e perseguição de crimes futuros;
Modificam regras do Código Penal, dificultando condenações por crimes contra a democracia;
Ameaçam magistrados por “abuso de autoridade” caso descumpram a lei.
Jogar a constituição no lixo
A Constituição, no artigo 5º, veda anistia para condenados por tortura, tráfico de drogas, terrorismo e crimes hediondos. Numa reportagem da Agência Brasil, o ministro Dias Toffoli afirmou que, por “coerência interna” da Carta, essa proibição deve se estender também às infrações contra a ordem democrática.
Na mesma reportagem, especialistas apontaram outro problema de inconstitucionalidade. A jurista Tânia Maria de Oliveira, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), por exemplo, disse que o projeto fere a separação de Poderes ao permitir que o Congresso interfira em atribuição exclusiva do Judiciário. Essas pessoas foram processadas julgadas e criminalizadas no STF. “Se o Legislativo decidir conceder anistia, estará invadindo claramente a competência do Supremo”, afirmou.
De uma maneira sucinta
O PL da Anistia é um pacote de medidas que mais parece um “cavalo de Tróia”: sob o discurso de amparar manifestantes comuns, a proposta esconde, apenas, uma estratégia para anistiar a quadrilha, como chamou o STF, pela tentativa de golpe, enfraquecer a estrutura de defesa do Estado Democrático de Direito e cassar decisões da justiça eleitoral, além de deslegitimar o Poder Judiciário.